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11 de maio de 2024

Comunidades rurais de Crato mantém incertezas sobre o CAC há mais de uma década

Há pelo menos 10 anos, localidades rurais no Crato, que serão atravessadas pela obra, cobram uma comunicação mais clara sobre seu destino com o CAC
Eixo emergencial do Cinturão das Aguas, em Missão Velha, já recebe águas da diversas vezes, a Secretaria de transposição do Rio São Francisco. Foto: Antonio Rodrigues

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Maior obra hídrica cearense, o Cinturão das Águas do Ceará (CAC) foi pensado para interligar as bacias hidrográficas e garantir a segurança hídrica do nosso estado. Contudo, há mais de uma década, as comunidades da região do Cariri, que serão atravessadas pelo empreendimento, alegam sofrer com a falta de informação sobre a desapropriação e os possíveis impactos que a obra representa. A angústia se intensificou no distrito do Baixio das Palmeiras, em Crato, nos últimos meses.

Os primeiros boatos de que o Baixio das Palmeiras estaria no trajeto do Trecho 1 do CAC chegou aos seus moradores em 2011, mas se materializou no ano seguinte, quando, segundo a própria comunidade, terrenos foram invadidos e cercas foram derrubadas por pessoas que não se identificaram. Tudo isso teria ocorrido durante a etapa de marcação da área do percurso do canal.

A partir daí, as associações rurais iniciaram uma luta pelo acesso à informação sobre o projeto. “Desde 2012, as comunidades do distrito do Baixio das Palmeiras travam uma luta contra este modelo de gestão hídrica do Ceará. É inaceitável que uma obra dessa magnitude seja planejada sem participação das comunidades atingidas”, defende o professor Liro Nobre, uma das lideranças da comunidade.

Após 12 anos, Liro aponta que ainda há famílias que não sabem se serão afetadas diretamente ou indiretamente pelo CAC. “Algumas não foram indenizadas”, reforça. Durante este período, as obras têm avançado em outros territórios do Crato e isso tem deixado ainda mais aflitos o Baixio das Palmeiras.

“Os relatos de comunidades vizinhas são de que a obra tem trazido um grande impacto, com indenizações injustas, cisternas perdidas. A gente se sente perdido”, desabafa o agricultor Assis Nicolau, presidente da Associação dos Agricultores Familiares Sagrada Família do Baixio do Muquém, que também compõe o distrito.

LUTA

Durante este período, o professor afirma que as lideranças comunitárias procuraram, por diversas vezes, a Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará (SRH) para pedir informações e estabelecer um diálogo, provocando reuniões no próprio território. “Ainda hoje estamos nessa situação de violação de direitos, sobretudo do direito à informação”, reforça Liro.

A problemática mobilizou a Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Ceará (CDHC/Alece), que já realizou três audiências públicas sobre o tema, em 2015, 2017 e, por último, no mês de novembro do ano passado. Autor do pedido das discussões, o deputado estadual Renato Roseno (Psol), que preside a comissão, conta que as demandas não mudaram, mesmo depois de muitos anos. “A comunidade nos procurou e nós temos instado o poder público em resolver o mesmo problema: a demanda de informação”, pontua.

“O que vai acontecer com essas comunidades? Quantas famílias ainda não foram indenizadas? Terá aluguel social? Elas vão ter acesso à água? São dúvidas legítimas, já que seus quintais serão atravessados por um canal aberto e uma obra de grande complexidade”, acrescenta o parlamentar.

DESCONFIANÇA

Nos últimos meses, os moradores do distrito denunciam estar convivendo com outra problemática: visitas às casas de lideranças por pessoas que não se identificam. “A gente fica preocupado, porque não sabe do que se trata. Tem que ter uma comissão entre pessoas da comunidade para dialogar”, sugere Assis. “Nós, lideranças comunitárias, insistimos que as informações prestadas pela SRH e a construtora, quando feitas, sejam expostas em espaços públicos, nas sedes das associações”, completa Liro.

Na avaliação das lideranças do Baixio das Palmeiras, as reuniões particulares, sem aviso prévio, têm causado um desconforto no restante da população. “Nós enxergamos isso como forma de intimidação”, expõe o professor. O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Alece, o deputado Renato Roseno, informou que vai dar ciência deste caso à segurança pública e à Procuradoria-Geral do Estado do Ceará (PGE), responsável pelo processo de indenização. “Isso tem gerado um temor. É importante reforçar que são famílias que estão lá há muitas gerações, muitos são idosos. É necessário saber quem são essas pessoas, de qual órgão”.

Em nota, a SRH informou que, em conjunto com a PGE, estão planejando ações com a comunidade para sanar as dúvidas. A previsão é que este trabalho se inicie já a partir deste mês de março. A pasta informou ainda que, até o momento, aproximadamente 94 imóveis serão desapropriados no distrito, “no entanto, o número exato só será definido após a conclusão dos trabalhos junto à comunidade e conclusão do projeto executivo da obra”, completou.

ENTENDA A OBRA

O Trecho 1 do Cinturão das Águas do Ceará (CAC) possui 145 quilômetros de extensão, entre canais, sifões e túneis, que vai do município de Jati à Nova Olinda. Subdivido em cinco lotes, três deles já foram concluídos (1, 2 e 5). Os subtrechos 3 e 4 estão com avanço físico de 45,60% e 41,86%, respectivamente, segundo a SRH. A previsão é de que as obras sejam finalizadas até dezembro de 2024.

A primeira etapa do CAC é responsável por captar a água do Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF). A partir do chamado “eixo emergencial”, que colhe a água do “Velho Chico”, em Jati, a 53 quilômetros, até chegar ao Riacho Seco, em Missão Velha, é possível que o recurso hídrico chegue à Região Metropolitana Fortaleza. Do Riacho Seco, a água segue por 13 quilômetros até o Rio Salgado, este, que deságua no Rio Jaguaribe, que por gravidade gera aporte ao Açude Castanhão.

Antonio Rodrigues

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