Iniciou nesta terça-feira (14) a retirada de vegetação nativa próxima ao Aeroporto Internacional Pinto Martins, em Fortaleza, onde será realizado o Fortal 2024. A situação tem gerado debate entre agentes políticos da Capital e do Estado. O vereador de Fortaleza, Gabriel Aguiar (Psol), denunciou que o desmatamento de 20 hectares de área seria proibido, uma vez que seriam de Mata Atlântica, a tornando protegida por Lei Federal. O Fortal, por sua vez, nega que a área em questão seja protegida pela legislação federal.
“Profunda revolta, alarme e alerta diante do novo local”, disse Aguiar, que oficiou sete entidades visando esclarecer as informações acerca do desmatamento da área, incluindo a Fraport, empresa responsável pelo gerenciamento do Aeroporto, e a Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente de Fortaleza (Seuma), que foi questionada sobre qual a responsabilidade do órgão e da Prefeitura de Fortaleza para que o desmatamento fosse inciado. O órgão informou, ao OPINIÃO CE, no entanto, que não recebeu nenhum ofício referente ao assunto.
O OPINIÃO CE também entrou em contato com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que disse estar acompanhando o caso. “O Ibama acompanha o caso e informa que a competência do assunto é do Estado”, disse.
“No terreno onde hoje está instalado o Aeroporto Internacional Pinto Martins, existe uma grande floresta de mais ou menos 20 hectares de mata fechada, com árvores de grande porte, uma rica biodiversidade de animais silvestres. E o Fortal está achando razoável desmatar essas centenas ou milhares de árvores para fazer um evento que tem quatro dias de festa”, disse Gabriel, durante sessão na Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor).
O vereador Márcio Martins (União Brasil), presidente da Comissão de Política Urbana e Meio Ambiente da CMFor, afirmou que Gabriel “não fez o dever de casa”, já que ele não entregou nenhum documento em que confirma que tal área corresponde a uma área de preservação ambiental. “Quero ouvir o Ibama, a Seuma, a Sema e a Semace, porque se for, na verdade, uma prática de crime ambiental, eu vou abraçar. Agora, se for mais uma tentativa de usar uma referência da cidade, algo bom, como escada para garantir a reeleição de vereador, eu discuto”.
Gabriel Aguiar destacou que, pela área ser protegida pela Lei Federal da Mata Atlântica, e por estar dentro do zoneamento ambiental, não pode ser desmatada. “Acho que dentro das prioridades do Município não é razoável você derrubar uma vegetação tão grande, uma floresta tão consolidada para fazer um evento como esse”, destacou.
Além da Fraport e da Seuma, o vereador informou que oficiou os seguintes órgãos públicos: a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE). À Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Ceará e à Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), órgãos estaduais, o vereador solicitou informações acerca do licenciamento ambiental do empreendimento.
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ESTADO
A reportagem tentou contato com a Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Ceará (Sema), que, inicialmente preferiu não se pronunciar sobre o caso. Após a publicação da matéria, no entanto, a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), autarquia vinculada à Sema, se pronunciou. “A Semace realizou vistoria na área indicada no processo e concluiu que o imóvel apresenta vegetação herbácea, frutífera e invasora, para as quais não é necessário Autorização de Supressão de Vegetação (ASV) e/ou Uso Alternativo do Solo (AUS), conforme Resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente (COEMA) Nº 02/2019”, aponta.
Também foi constatado, contudo, que 80% da vegetação presente é vegetação nativa, incluindo espécies indicadoras do bioma Mata Atlântica, para a qual há necessidade de solicitar uma Autorização para Uso Alternativo do Solo (UAS).
O QUE DIZ O FORTAL
Após a publicação desta matéria, a organização do Fortal respondeu ao OPINIÃO CE, negando que a área faça parte da Mata Atlântica e afirmando que tanto a Semace como a Sema garantiram autorização para o desmatamento da mata local. “A área em que será realizado o Fortal não faz parte da Mata Atlântica conforme delimitação pela Lei Nº11.428/2006, no mapeamento oficial da Fundação SOS Mata Atlântica. Desta forma, a Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428/2006), que delimita os espaços desse bioma, não se aplica à região”. Ainda de acordo com a organizaçao do evento, o local “já apresentava antropização prévia, com ruas, pavimentação e construções em ruínas, devido ao seu passado como antiga base aérea”.
Conforme o Fortal, a Semace autorizou para a retirada de vegetação herbácea, de acordo com o “Ofício nº 27580/2024/GS/DIFLO”. “Considerando o disposto na resolução COEMA nº 02 de 2019, art. 6º, inciso I, que trata do licenciamento florestal. Com base na mesma resolução, em áreas com predominância de herbácea no interior do terreno, NÃO SERÁ NECESSÁRIO solicitar Autorização de Supressão de Vegetação (ASV) e/ou Uso Alternativo do Solo (UAS), aplicando-se também as espécies frutíferas, exóticas e ornamentais”.
A organização enviou ainda trecho de autorização da Sema, o “Ofício Nº 733/2024-SEXEC/GAB/SEMA”: “Nesse sentido, informamos que, de acordo com o que fora informado no referido ofício, a vegetação a ser removida, trata-se de natureza herbácea (capim), situada no interior de terreno/empreendimento já licenciado”. De acordo com a diretoria do evento, o licenciamento ambiental está em andamento, “seguindo todos os parâmetros legais” e incluindo a realização de um inventário florestal completo da área. O objetivo de tal ação seria identificar as especies presentes, visando preservar o patrimônio verde nativo, além de realizar ainda outras ações de proteção ao meio ambiente.
ÓRGÃOS OFICIADOS
À Fraport, Aguiar informou que enviou o ofício para questionar acerca do contrato da companhia com a empresa responsável pela festa do Fortal. Já para a Seuma, órgão do Executivo fortalezense, o vereador questionou a responsabilidade da Prefeitura de Fortaleza no licenciamento e na aprovação da instalação da festa no local, além do desmatamento da área de proteção. Para a Sema e a Semace, além de pedir informações do licenciamento ambiental, ele questiona ainda se os dois órgãos possuem ciência de que a área é demarcada como mata atlântica por Lei Federal. As pastas preferiram não comentar o assunto.
Ao MPCE, o vereador se juntou ao deputado estadual Renato Roseno (Psol) para enviar o ofício. Na ocasião, os dois parlamentares pediram para que o órgão investigasse os pontos importantes acerca do desmatamento do local para a realização do Fortal. Ao OPINIÃO CE, o MP cearense informou que o caso foi distribuído com caráter de urgência para a 136ª Promotoria de Justiça de Fortaleza, no qual a situação será averiguada.