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20 de maio de 2024

“Vamos solicitar pedido de caducidade do contrato da Enel”, diz relator da CPI na Alece

Nesta terça-feira (7), vai ser lido e votado o relatório realizado pela Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga os serviços prestados pela empresa; ao OPINIÃO CE, o deputado estadual Guilherme Landim falou sobre o momento e o que espera que seja alcançado pelos trabalhos da CPI
Deputado estadual Guilherme Landim, relator da CPI da Enel, em visita ao OPINIÃO CE. Foto: Priscila Baima

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A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga os serviços prestados pela Enel no Ceará apresenta, nesta terça-feira (7), o relatório final dos trabalhos. O documento será submetido à votação do colegiado. Sendo aprovado, ele será enviado a órgãos como a Agência Reguladora de Energia Elétrica (Aneel), o Ministério Público Federal (MPF), o Programa de Orientação, Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) e o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon). Segundo o relator da CPI da Enel, deputado Guilherme Landim (PDT), em entrevista exclusiva ao OPINIÃO CE, será solicitada a caducidade do contrato da Enel junto à Aneel, ou seja, a quebra do contrato com a empresa.

No Ceará, a multinacional de matriz italiana, responsável pelos serviços de distribuição de energia no Estado, assinou um contrato válido por 30 anos, em 1998. Ou seja, a vigência da atuação da Enel no território cearense vai até 2028. Com mais cinco anos a vencer, no entanto, os deputados estaduais que atuam na CPI solicitam que a empresa melhore os seus serviços ou deixe o Estado. A expectativa, no entanto, é de que a medida extrema não ocorra, mas que sirva como pressão para que a Aneel tome as demais providências exigidas. Confira a entrevista realizada nos estúdios do OPINIÃO CE:

OPINIÃO CE – Estamos finalizando a CPI. Como o senhor avalia o trabalho da Comissão Parlamentar?

GUILHERME LANDIM – Foi um trabalho árduo, iniciado ainda na Legislatura passada, na Comissão Especial que analisou, primeiro, o contrato de concessão, onde conseguimos identificar diversos descumprimentos e fizemos solicitações à Aneel, ao Judiciário cearense, à própria Enel, visando uma melhoria nos serviços. Indicamos também que se nada melhorasse, a Assembleia abriria uma CPI. Foi isso que foi feito e, ao longo desse tempo, muitas novas informações apareceram, coisas que confesso que eu não tinha a menor ideia.

A gente conseguiu entender um pouco do que realmente está acontecendo no Estado do Ceará, o porquê da piora desse serviço. Uma coisa que intrigou sempre a todos nós é que tivemos aqui, durante muitos anos, a melhor concessionária de energia do Brasil. A Enel Ceará foi, durante oito anos, a melhor do Nordeste, durante seis anos a melhor do Brasil, mas de 2016 para cá começou uma derrocada, maltratando o povo do Estado, descumprindo o seu contrato, descumprindo os prazos. Isso nos fez agilizar a abertura da CPI e hoje estamos aqui prestes a entregar o relatório final para que a gente possa, a partir daí, poder ver esses vários atores agirem de forma mais enfática para obrigar essa empresa a melhorar, urgentemente, esses serviços ou ir embora do Ceará. Não tem outra opção que não essas duas. Imaginamos que, ao fim desse trabalho, nós vamos ver a melhora desse serviço. É a única coisa que nós queremos.

Foto: Priscila Baima/OPINIÃO CE

OPINIÃO CE – Quais os principais pontos que serão cobrados no relatório?

GUILHERME LANDIM – Com todas as informações que buscamos, a gente pôde fazer encaminhamentos. Primeiro, fizemos constatações. Dentro delas, temos que a Enel, está prejudicando a economia do Ceará, porque o Estado está deixando de crescer por conta desse péssimo serviço, dessa demora em prestar esse serviço. Além disso, constatamos absurdamente que a Aneel é conivente com tudo isso. Infelizmente, preciso dizer isso, a Assembleia Legislativa não tem o poder de punir essa empresa e nem de tirá-la do Ceará, porque o contrato não é nosso, o contrato é federal. Precisamos que a Aneel, que é a fiscal do contrato, faça o seu trabalho.

A gente vem trazendo uma série de encaminhamentos para a Aneel, solicitando mudança na regulamentação, solicitando que ela pare de dar novos prazos. Ela fiscaliza essa empresa através da Arce, identifica que tem uma falha e dá um ano de prazo para melhorar, quando completa esse ano ela não melhora, ela dá mais um ano, ela diminui o valor das multas… Tem que parar com isso, urgentemente, e agir. Ou você faz, ou você vai embora do Estado, pode se abrir um processo para isso. Temos outros encaminhamentos para a Aneel sobre diversos pontos específicos, como a frequência da falta de energia, sobre os prejuízos que ela tem causado para o comércio, para o pequeno consumidor que tem sua geladeira perdida e é um absurdo para conseguir chegar ao ressarcimento disso. Ao fim, mostrando a ela ponto a ponto os descumprimentos do contrato.

Tem uma cláusula do contrato que foi assinado pela Enel e pelo Governo Federal, há 30 anos, que diz que um percentual da receita arrecadada pela empresa precisa ser gasto, obrigatoriamente, com obras do Governo do Estado, sejam elas quais forem: uma nova linha de transmissão para um município ou a ligação de uma obra do Estado. A Enel vem descumprindo isso reiteradamente. Temos obras com 10 anos de atraso. Hoje, existem 81 obras em atraso, já chegaram a ter 140. Isso é uma quebra de contrato. E por isso muitos outros pontos, estamos solicitando que a Aneel entre com o pedido de caducidade do contrato. O que é isso: o fim do contrato com essa empresa para que venha outra ou para que o Ceará volte a tomar conta desse setor de energia. Logicamente, existe um processo a ser seguido, tem um prazo a ser dado para que uma nova empresa chegue ou que haja a reestatização. Mas a gente pede isso à Aneel.

Também pedimos uma série de coisas à própria Enel. Porque, como essa quebra não pode ser de hoje para amanhã, vamos ter que conviver com ela durante ou até o fim do contrato, ou o tempo que for ainda necessário. Enquanto ela estiver aqui, que ela cumpra uma série de questões que vem descumprindo hoje.

Presidente da Enel participou de oitiva na CPI em 24 de abil. Foto: Divulgação

OPINIÃO CE – Há algum ponto além de cumprir com o que já está acordado no contrato? E como isso vai ser feito, é a Enel que vai apresentar esse novo modelo?

GUILHERME LANDIM – Além desses encaminhamentos à Aneel e à Enel, também fizemos a outros órgãos. Fizemos, por exemplo, ao Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Defensoria Pública, Decon e Procon que entrem com ação coletiva de danos morais para que a população cearense, que está sendo tão prejudicada ao longo dos anos, tenha um ressarcimento de tudo que já perdeu durante esses anos. É uma ação civil pública [ACP] que a gente sugere a esses órgãos, que entrem de imediato contra a Enel. Também sugerimos que a Procuradoria Geral do Estado entre com ação contra a Enel para que ela cumpra os prazos desse programa de investimento institucional que ela tem que fazer e não vem cumprindo. Valores a gente deixa em aberto, porque ao longo da ação ela vai poder entender qual a melhor forma de fazer isso.

A Sudene, nos últimos 10 anos, com a Receita Federal, concedeu mais de R$ 800 milhões de isenção fiscal à Enel. Está agora na mesa da Sudene uma renovação indo até o fim do contrato. Estamos solicitando da Sudene que não renove esse contrato de isenção, porque essa isenção é para gerar emprego e renda no Estado, e ela [a Enel] não tem feito isso. No plano que ela apresentou agora, ela coloca um aumento fictício do número de funcionários que ela vai contratar e que conseguimos, na oitiva da Enel, desmascarar em uma pergunta. Ficou evidente que ela vai contratar essas pessoas e demitir os terceirizados. Ela não vai aumentar a força do trabalho, que caiu 42% ao longo dos últimos anos. A gente pede no relatório, também, para ser restabelecido esses 42% de mão de obra, que está impactando diretamente no resultado final, que é o péssimo serviço para o povo cearense.

OPINIÃO CE – A Enel se mexeu, inclusive, com uma mudança na direção, com um novo presidente. Como você vê a mudança de postura da Enel nos últimos meses e qual sua impressão em relação à oitiva do Dr. Nunes, o novo presidente?

GUILHERME LANDIM – Eu noto, claramente, que a Enel finalmente se preocupou, acho que a CPI funcionou muito bem para fazer essa mobilização junto à sociedade, ao Judiciário cearense, à imprensa, e mexeu com a Aneel. Eu tenho informações de dentro da Arce, que na reunião em que foi liberada para a Arce começar uma nova fiscalização em andamento, a Aneel foi muito clara e disse: ‘nós precisamos deste relatório o quanto antes, porque não aguentamos mais tanta cobrança’. Então, eu acho que isso é fruto dessa mobilização da CPI.

Com tudo isso, a Enel viu que precisava mudar de postura. Trouxe uma pessoa muito experiente, que tem um trânsito muito grande dentro do Estado, que é o Nunes, um técnico capacitado e que deixou claro, na oitiva da Enel, que quer mudar a postura da empresa e melhorar os serviços. A todo momento, perguntei o porquê de eles deixaram chegar a esse ponto, e ele em nenhum momento queria falar do passado. Não queria dizer qual o fato gerador que chegou a tudo isso. Mas nós conseguimos chegar nesse fato gerador e ele está no relatório. No investimento que a empresa faz ao longo de todos os anos, há um investimento anual de cerca de R$ 1,5 bilhão. Quando fomos esmiuçar esse número, vimos que apenas 16%, em média, desse valor é para manutenção, para compra de equipamentos, para o dia a dia, para não faltar energia na casa das pessoas e restabelecer a energia de maneira mais rápida. Só 16%. O restante, ela coloca dentro disso quando faz uma nova linha de transmissão, que não tem nada a ver com qualidade do serviço. 

Foto: Priscila Baima/OPINIÃO CE

O Nunes falou na CPI que a Enel vai aumentar o investimento, que está comprando novos equipamentos, falou inclusive que já chegaram 119 novos caminhões aqui para Fortaleza e Região Metropolitana, que chegará a 300 no Estado inteiro. Então, imagino e quero acreditar que eles viram que chegaram no fundo do poço, que estão sob risco, realmente, de perder esse contrato depois de toda essa mobilização.

Outro ponto que eu coloco no relatório e espero que seja aprovado pela Comissão, é que a Assembleia crie uma Comissão Permanente para acompanhar esse plano operacional que a Enel prometeu e que ela seja obrigada a, mensalmente, prestar contas de cada um dos pontos. Como nós não temos o poder de mexer com a Aneel, porque é um órgão federal, estamos também solicitando à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal, que abra uma CPI contra a Aneel, porque o problema está lá em cima. Se ela fizesse o trabalho dela e fiscalizasse de verdade, as empresas não estariam fazendo o que a Enel está fazendo aqui no Ceará.

OPINIÃO CE – O relatório será apresentado e votado nesta terça-feira, mas e depois?

GUILHERME LANDIM – Vamos apresentar o relatório, votar na Comissão. Em caso de aprovação, vamos encaminhar a cada um desses órgãos que falei e outros mais, porque são vários encaminhamentos, e vamos, a partir daí, cobrar. A Assembleia, infelizmente, tem limitações, a CPI não chega a punir. Ela faz um relatório e encaminha para os órgãos que têm o poder de fazer a punição ou fazer a investigação. É isso que estamos fazendo. Vamos continuar cobrando desses órgãos do Judiciário, vamos cobrar do ministro de Minas e Energia. Estamos solicitando a ele a intervenção junto à Aneel para a caducidade do contrato.  Vamos cobrar cada um dos encaminhamentos para que a gente possa ver o serviço melhorar, que é a única coisa que a gente quer. Não temos absolutamente nada pessoal contra essa empresa ou quem quer que seja que trabalhe nela. Mas o povo do Ceará não pode ser tratado da forma como está sendo tratado, com uma conta muito cara, porque nós, ano após ano, recebemos reajustes maiores do que outros estados, e tendo um serviço, ano após ano, pior.

Redação OPINIÃO CE

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