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14 de setembro de 2024

Unimed descredencia hospital psiquiátrico em Fortaleza e gera incerteza para 73 pacientes

O Hospital Nosso Lar foi descredenciado pela cooperativa de saúde, que recomendou a transferência dos pacientes para o Instituto Volta Vida, instituição autuada pela Agefis por necessidade de adequação sanitária, em maio
Grupo de familiares em protesto acerca do descredenciamento do Hospital Nosso Lar. Foto: Reprodução

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Amanda [nome fictício], de 78 anos, paciente com esquizofrenia e depressão do Hospital Nosso Lar, pode estar com os dias do seu tratamento na instituição contados. Em frente ao descredenciamento da Unidade Hospitalar pela Unimed Fortaleza, ela deveria ser transferida para o Instituto Volta Vida (IVV), local do qual a cooperativa disponibilizou para a transferência dos pacientes. Por ter conseguido uma liminar, no entanto, Amanda* pode permanecer no Nosso Lar até uma decisão definitiva da Justiça. A outros enfermos, entretanto, não há essa garantia.

Segundo a direção do Nosso Lar, 73 pacientes são atendidos atualmente através do Plano de Saúde da Unimed. Desse total, conforme integrantes do grupo “Em Busca do Direito”, de familiares dos pacientes, em torno de 30 possuem liminares deferidas para dar continuidade aos seus tratamentos no Hospital. Ou seja, cerca de 40 pacientes – caso não consigam a liminar na Justiça -, devem ser transferidos ao IVV, no bairro Lagoa Redonda.

Conforme José* [nome fictício], 47, filho de Amanda*, ao OPINIÃO CE, sua mãe está internada na instituição há alguns meses. Como pontuou ele, há pouco mais de um ano, a Unimed Fortaleza teria afirmado que os pacientes com planos simples não seriam atendidos pelo hospital. “A partir de tal dia, só seria admitido Multiplan, que é aquele plano mais caro”. A mãe de Bezerra já possuía tal plano, mas, como frisou, apenas os que tinham condições financeiras de arcar com os custos conseguiram migrar para o Multiplan.

“Passou um tempo, e eles falaram: ‘atenção, todo mundo, nós não vamos aceitar plano nenhum. O hospital vai ser descredenciado’”, disse.

DESCREDENCIAMENTO SEM MOTIVAÇÃO

José* afirmou que a Unimed Fortaleza está colocando os familiares contra a parede. “O Nosso Lar não tem como manter filantropicamente os pacientes e a Unimed não quer pagar”, afirmou. “O que está em jogo, urgentemente nesse momento, é o amparo a essas pessoas”, completou.

Conforme Aleks Mesquita, presidente do Nosso Lar, a Unimed Fortaleza informou do descredenciamento no dia 4 de janeiro ao Hospital. No entanto, como explicou o presidente, não houve qualquer explicação dos motivos que levaram à decisão. “Nos 34 anos que atendemos a Unimed, sempre tivemos uma relação de parceria e nunca houve qualquer tipo de indisposição ou ameaça de descredenciamento. (…) Até hoje, nunca nos foi aberto um canal de negociação com relação à manutenção ou renovação do contrato”, afirmou.

Como também pontuou Mesquita, a Unimed deve valores que se acumulam desde agosto de 2023 à instituição. A quitação do débito – do qual a instituição não quis informar o valor -, segundo ele, ficou de ser realizada até o dia 15 de novembro. 

De acordo com a Unimed Fortaleza, ao OPINIÃO CE, foram disponibilizados profissionais para a programação da transferência dos pacientes que estavam internados, com a garantia de assistência aos beneficiários e a manutenção do atendimento. “Todo o processo está sendo acompanhado junto ao Ministério Público do Estado do Ceará”, informou. Questionada sobre a motivação que levou ao descredenciamento do Nosso Lar, no entanto, a cooperativa não respondeu o questionamento.

DEFESA TENTA PERMANÊNCIA DOS PACIENTES NO NOSSO LAR

A advogada Mágela Prado, que trabalha na defesa de alguns pacientes do hospital, também destacou o descredenciamento sem motivação. “Com isso [o descredenciamento], já começou a gerar um monte de problemas, porque esse anúncio não veio motivado por absolutamente nada. Nem sequer chamou o hospital para negociar se era uma questão de valores ou se era uma questão interna entre eles”. Segundo ela, “em nenhum momento desqualificaram o Hospital Nosso Lar”. Inicialmente, como explicou a advogada, havia o prazo até o mês de março para que os pacientes fossem transferidos ao IVV, mas com a entrada do caso na Justiça, este prazo foi se estendendo, até chegar aos dias atuais. Não há um novo prazo definido para a transferência.

Ainda conforme a representante, a Unimed está tentando “burlar a lei”. Segundo Mágela, a cooperativa alegou que a transferência se tratava de uma substituição. No entanto, como explicou, para ser substituída, a nova instituição não poderia ser credenciada à Unimed. “O IVV já é credenciado à Unimed Fortaleza há quase duas décadas”, disse. “A Unimed Fortaleza não chegou para nenhuma família de paciente internado para dizer, ‘olha, esse hospital vai ser descredenciado’, ou até mesmo aquele aviso que eles mandam pela fatura”. Ela continuou, pontuando outros dois requisitos presentes no Código de Defesa do Consumidor (CDC) acerca do descredenciamento

“Uma delas é avisar o paciente com 30 dias de antecedência; e a segunda, de que o espaço em que os pacientes sejam transferidos, seja um local com equivalência ao que eles estavam antes”.

Sobre o último ponto, Mágela alertou para preocupações com a nova instituição. “No IVV, muitos dos pacientes que já estiveram internados lá, disseram que as condições eram péssimas, eles não eram qualificados. Inclusive, a experiência deles era com os adictos”, afirmou ela.

FISCALIZAÇÕES E PREOCUPAÇÕES COM O IVV

Segundo a representante, o Ministério Público já chegou a acionar órgãos públicos para fiscalizar o IVV. “A primeira fiscalização que houve lá foi no mês de maio, do Corpo de Bombeiros, onde detectaram várias irregularidades técnicas e infraestruturais, que dizem respeito à segurança. Depois, foi a Agefis [Agência de Fiscalização de Fortaleza], que fez todo um laudo sanitário, inclusive, na conclusão do laudo, eles colocaram que só não iam fechar a instituição por uma questão humanitária, que havia muitos pacientes internados”. O OPINIÃO CE teve acesso aos documentos que alegam haverem irregularidades.

“Se esse descredenciamento tivesse ocorrido em março, como planejavam, ela iria colocar os pacientes em um local com problemas de infraestrutura, com relação à segurança dos pacientes. Depois, com problemas sanitários, que a própria Agefis diagnosticou. E ainda tem outro problema que é o corpo técnico, de médicos, enfermeiros, que em relação ao Nosso Lar é muito menor”.

Na fiscalização do Corpo de Bombeiros, foi solicitado o aumento da área construída, a alteração do layout aprovado pelos bombeiros, alteração no acesso de viaturas ao estabelecimento e providenciar a atualização do projeto contra incêndio e pânico. A Agefis, em sua fiscalização, concluiu que o estabelecimento necessita de adequações, “conforme a legislação sanitária determina”. À época, foi dado prazo de 30 dias úteis para a regularização.

AS LIMINARES

Alguns pacientes, como reforçou a advogada, conseguiram liminares para dar continuidade ao atendimento no Nosso Lar. “Isso é ótimo para eles, porque eles têm assegurado aquele tratamento, pelo menos durante um tempo”. No entanto, segundo Mágela, a Unimed Fortaleza pode entrar com uma contestação. “Muitas vezes, cai em um desembargador, em uma instância superior, que ele concorda com o que a Unimed está pleiteando e não vê o caráter humanitário do paciente, que está brigando para não ser colocado em outro estabelecimento, para permanecer no seu tratamento e dar continuidade a ele”.

A liminar funciona em caráter de urgência, ainda antes de sair uma sentença judicial. Assim, quando há grave risco de dano ao paciente, é pedido uma tutela antecedente de urgência. “Naquele momento, quando o juiz defere aquela liminar, ele tem o direito de permanecer naquela instituição em seu tratamento, ele não vai poder ser transferido para nenhum outro local, mesmo que a Unimed queira, ela vai ter a obrigação de custear o tratamento dele, pelo menos até a sentença”.

“Chegando na sentença, pode ser que o juiz deixe favorável, pode ser que ele mude de opinião, mas o que eu tenho visto é que quando um juiz dá uma decisão interlocutória que é essa liminar antes da sentença, a gente já entende mais ou menos que ele aceitou os nossos argumentos, então para ele mudar vai ter que ter uma defesa que o convença pela Unimed”.

ATUAÇÃO DO LEGISLATIVO FRENTE AO CASO

Da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece), os deputados Guilherme Sampaio (PT) e Renato Roseno (Psol) têm se reunido com os familiares dos pacientes para discutir o assunto. Guilherme entrou com pedido de Audiência Pública Conjunta nas comissões de Defesa do consumidor, Previdência Social e Saúde e Direitos Humanos e Cidadania para discutir o tema na Casa. Ao momento, a solicitação foi aprovada na Comissão de Direitos Humanos e Cidadania, mas aguarda o parecer das demais comissões.

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