O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu, nesta segunda-feira (14) suspender a tramitação de todos os processos na Justiça brasileira que discutam a legalidade da chamada “pejotização”, em que empresas contratam prestadores de serviços como pessoa jurídica, evitando criar uma relação de vínculo empregatício formal.
A decisão foi tomada após o STF ter reconhecido, em votação terminada no último sábado (12), a repercussão geral do assunto. Isso quer dizer que os ministros selecionaram um processo do tipo para que o desfecho sirva de parâmetro para todos os casos semelhantes, unificando o entendimento da Justiça como um todo.
O tema tem colocado o Supremo Tribunal Federal em rota de colisão com a Justiça Trabalhista ao menos desde 2018, quando o STF julgou ser inconstitucional uma súmula do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que barrava a pejotização.
Na ocasião, o STF decidiu, por maioria, liberar as empresas brasileiras, privadas ou públicas, para terceirizarem até mesmo suas atividades fim, não somente os serviços de apoio, como limpeza e vigilância. Desde então, esse entendimento tem embasado milhares de decisões dos ministros da corte para derrubar vínculos empregatícios reconhecidos pela Justiça Trabalhista.
Para a corrente majoritária do STF, a decisão sobre terceirização garante a atualização das relações de trabalho para uma nova realidade laboral, conferindo maior liberdade de organização produtiva dos cidadãos e validando diferentes formas de divisão do trabalho, conforme escrito por Gilmar Mendes, relator do tema no tribunal.
Ao reconhecer a repercussão geral do assunto, Gilmar Mendes frisou o grande volume de recursos que chegam ao STF todos os anos, do tipo chamado reclamação constitucional, em que empresas buscam reverter o reconhecimento de vínculos trabalhistas, alegando descumprimento da decisão da corte sobre a terceirização irrestrita.
O ministro deu como exemplo o primeiro semestre de 2024, quando foram julgadas pelas duas turmas do Supremo Tribunal Federal mais de 460 reclamações que envolviam decisões da Justiça do Trabalho que, em maior ou menor grau, restringiam a liberdade de organização produtiva. No mesmo período, foram 1.280 decisões individuais sobre o assunto.
“Conforme evidenciado, o descumprimento sistemático da orientação do Supremo Tribunal Federal pela Justiça do Trabalho tem contribuído para um cenário de grande insegurança jurídica, resultando na multiplicação de demandas que chegam ao STF, transformando-o, na prática, em instância revisora de decisões trabalhistas“, escreveu Gilmar Mendes na decisão desta segunda.
O recurso que servirá de padrão sobre o assunto trata do reconhecimento de vínculo empregatício entre um corretor de seguros franqueado e uma grande seguradora, todavia Gilmar Mendes destacou que uma eventual tese de repercussão geral deverá ter alcance amplo, considerando todas as modalidades de contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços.
“É fundamental abordar a controvérsia de maneira ampla, considerando todas as modalidades de contratação civil/comercial. Isso inclui, por exemplo, contratos com representantes comerciais, corretores de imóveis, advogados associados, profissionais da saúde, artistas, profissionais da área de TI, motoboys, entregadores, entre outros”, afirmou Gilmar Mendes.
Não há data definida para que o STF paute o processo para julgamento pelo plenário. Quando isso ocorrer, os ministros deverão decidir sobre três pontos já pré-definidos. O primeiro definirá se a Justiça do Trabalho é a única competente para julgar as causas em que se discute a fraude no contrato civil de prestação de serviços;
O segundo apontará se é legal que empresas contratem trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, à luz do entendimento firmado pelo STF no julgamento sobre a terceirização de atividade-fim. Por último, será definido se cabe ao empregado ou ao empregador o ônus de provar se um contrato de prestação de serviços foi firmado para fraudar as relações trabalhistas ou não.
UBERIZAÇÃO
O tema da pejotização está relacionado também ao fenômeno chamado uberização, que trata da prestação de serviços por autônomos via aplicativos para celular, como é o caso dos motoristas da plataforma Uber.
Em fevereiro do ano passado, o STF já havia reconhecido a repercussão geral num recurso sobre uberização, no qual deve definir se há ou não vínculo de emprego formal entre motoristas de aplicativos de transportes e as empresas responsáveis pelas plataformas.
Com informações da Agência Brasil.