Rose Serafim
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Dos 27 senadores eleitos neste domingo, 2, 20 são apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL), que somará na próxima Legislatura 13 parlamentares, formando a maior bancada da Casa. Na Câmara dos Deputados, o PL se transformou na maior bancada e saltou de 76 para 99 parlamentares. Com isso, o mandatário, vencendo ou não no segundo turno, tem aliados que podem render muita dor de cabeça ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) num possível mandato.
O cientista político e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) José Antônio Spinelli argumenta que esse suposto conforto para Bolsonaro é “aparência”, já que os parlamentares têm interesses próprios, e um governante precisa saber dialogar com eles. O docente lembra que Lula não teve maioria no Congresso nem quando foi presidente por dois mandatos.
“É possível que um presidente consiga passar seus projetos e suas propostas mesmo sem uma maioria inicial. A relação de Bolsonaro com o Congresso não foi propriamente amistosa. Pelo contrário.” Dentre as situações em que Bolsonaro teve que aprender a lidar foi a do Orçamento Secreto, verbas indicadas pelos parlamentares para suas bases eleitorais sem esclarecimento sobre a destinação desse recurso.
“Parece que o orçamento secreto foi algo que veio para ficar. O próprio Bolsonaro teve que engolir. Mas, em muitos casos, isso o beneficiou. Se [Lula] for eleito, isso é algo que o ex-presidente vai ter que enfrentar. O chefe do Executivo é o dono da caneta, da chave que abre os cofres. “Não acredito que isso seja um obstáculo intransponível para o ex-presidente, se for ele o eleito.”
A socióloga Monalisa Torres, da Universidade Estadual do Ceará (Uece), lembra que o Congresso sempre teve um perfil mais à direita, desde a redemocratização. “Desde 1989, o perfil dos partidos é a partir dessa lógica de divisão ideológica. Teve uma tendência de sempre ser mais direita, de centro, principalmente no início desse período de redemocratização, com o MDB muito forte, outros partidos mais ligados ao centro, um pouquinho à direita e depois um certo crescimento do campo da direita que foi inflado pela onda Bolsonaro em 2018 e que ficou agora.”
A professora avalia que Lula vai encontrar desafios e precisar abrir mão de muita coisa num possível mandato. “A base mesmo a esquerda é bem pequena comparada à direita. Ele vai ter que fazer muitas concessões, abrir mão de algumas coisas, vai ter que negociar bastante e vai precisar de muita habilidade pra isso.” Já Bolsonaro, dado o perfil ideológico semelhante, poderá encontrar facilidade para avançar pautas conservadoras.
MINORIAS
Direitos das mulheres, de pessoas negras, de indígenas e até pautas ambientais tendem a ter menos vez nessa formatação do Congresso, avalia Spinelli. “Se o eleito for o presidente bolsonaro, contando com esse Congresso conservador, certamente, essas pautas vão sofrer reveses muito sérios”, afirma.
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Na Câmara dos Deputados, a esquerda passou a crescer quando Lula foi eleito para o primeiro mandato, em 2002, quando somente o PT levou 90 cadeiras. Agora, a situação se repete: nestas eleições, a federação PT-PCdoB-PV, teve 80 deputados eleitos (PT com 68, PCdoB com 6 e PV com 6). O PSOL pulou de 10 para 14 nomes. O PSB de Geraldo Alckmin, vice do petista, é que caiu de 24 para 14 assentos.
O PDT de Ciro Gomes, nome teoricamente de centro-esquerda, perdeu 2 das 19 vagas que tinha. Mas obteve vitória simbólica ao eleger Duda Salabert, uma das duas deputadas transexuais que farão sua estreia na Câmara ano que vem. A outra é Erika Hilton, do PSOL. O movimento Sem Terra (MST) também terá representações de peso, como Guilherme Boulos (PSol-SP), eleito com mais de 1 milhão de votos, e outros dois representantes petistas.