Voltar ao topo

18 de setembro de 2024

Rosto aproximado de Menina Benigna é apresentado pela primeira vez

Rosto foi apresentado na última quinta-feira, 25
Foto: Divulgação/Diocese do Crato

Compartilhar:

Antonio Rodrigues
CORRESPONDENTE NO INTERIOR DO ESTADO
antonio.rodrigues@opiniaoce.com.br

Rodrigo Rodrigues
rodrigo.rodrigues@opiniaoce.com.br

Cabelos longos até o ombro e levemente ondulados nas pontas. Morena clara, com olhos castanhos claros e vestido na cor vermelha com bolinhas brancas. Sandálias de couro, típicas do Cariri cearense e de outras partes do interior do Ceará. Olhos voltados ao horizonte, levemente para o alto, com mão esquerda no peito. Esta é a representação de Benigna Cardoso, a “Menina Benigna”, detalhada pela Igreja Católica pela primeira vez na última quinta-feira, 25, em coletiva de imprensa no Crato.

O rosto de Benigna precisou ser reconstituído a partir de relatos de quem conviveu com a menina e por meio de computação gráfica feita com auxílio de três fotos: de seu irmão, sua irmã e de uma sobrinha. O processo foi finalizado com a elaboração de um quadro e uma estátua com a fisionomia da menina. Esta é a quarta tentativa de aproximar o rosto de Benigna a uma imagem, explica o Padre Wesley Barros, coordenador da comissão para sua beatificação.

“Tivemos a colaboração de algumas pessoas que, ao longo da história, se debruçaram sobre esta possibilidade. A primeira representação pertenceu a Sônia Teixeira, a segunda é do nosso amigo Sandro Cidrão, a terceira foi colocada em cores por José Alves, depois de ter sido projetada a lápis por Gabriel Alves e, agora, temos a participação de duas pessoas importantes: o doutor Cícero Moraes, no âmbito da reconstrução facial e do projeto de uma estátua, e do artista pintor Joab Rocha, da cidade de Areal, na Paraíba.”

De acordo com o sacerdote, a caracterização se difere das demais pelo processo científico utilizado, deixando o resultado mais fidedigno, somado ao processo de confirmação com pessoas que conviveram com a futura beata.

O PROCESSO EM SI
Para o processo de aproximação do rosto de Benigna, foram utilizadas três fotografias 3×4, que também precisaram ser restauradas, por conta do desgaste do tempo: de Cirineu (irmão), Alderi (irmã) e Lourdes (sobrinha). “Esses três rostos serviram de ponto de partida para que fossem traçadas algumas linhas e chegássemos a uma reconstrução facial”, explica o padre.

“Em seguida, Cícero Moraes trabalhou na modelagem do que poderia ser o corpo até chegar em uma possibilidade de estátua. Acrescentamos os elementos que precisamos para a simbologia religiosa e os elementos que precisamos para a simbologia regional e do cotidiano de Benigna, as sandálias, o pote, até chegarmos ao projeto 3D.” A estátua foi impressa em parceria com o Departamento de Tecnologia do Colégio Pequeno Príncipe, em Crato.

A imagem tem, por exemplo, a intenção de oferecer um retrato da futura beata, mas, principalmente, de possibilitar uma representação mistagógica dentro da doutrina religiosa. A representação também traz a mão esquerda da menina no peito enquanto abraça um ramalhete contendo uma palma e três lírios. A mão direita está voltada para o alto enquanto o dedo indicador aponta para o céu. Segundo Dom Magnus Henrique Lopes, bispo da Diocese do Crato, estes são elementos que geram uma maior sensibilidade entre os fiéis.

“As pessoas mais simples conseguem fazer a leitura do coração que nem sempre a racionalidade humana consegue fazer. Ao falarmos que, cientificamente, procuramos aproximar aquele rosto que tínhamos do rosto verdadeiro de Benigna, as pessoas acolhem com muito amor.”

HISTÓRICO DA MENINA
Aclamada como “Heroína da Castidade”, a Menina Benigna é natural de Santana do Cariri e foi brutalmente assassinada aos 13 anos de idade, em 24 de outubro de 1941, com golpe de facas de seu vizinho, Raimundo Alves Ribeiro, conhecido como Raul, que a assediava.

Sua beatificação está marcada para 24 de outubro deste ano em Crato. A Diocese abriu o processo em 2011 e, dois anos depois, foi aceito pelo Vaticano. Ao ser aprovada, ela foi aclamada “Serva de Deus.” Depois de apresentar as virtudes necessárias, foi proclamada “Venerável.”

A beatificação é o primeiro passo para a canonização, quando a Igreja reconhece oficialmente a fama e o testemunho de santidade de alguém que viveu e morreu heroicamente, marcado por virtudes cristãs.

Na fase inicial, os teólogos investigaram as virtudes e as circunstâncias da morte. A comprovação de um milagre, critério necessário para tornar-se beato, é dispensado em caso de martírio, como é classificado o episódio de Benigna. Para os devotos “ela deu a vida para não cometer pecado.”

Além da extensa documentação que a equipe diocesana entregou na Sede da Igreja Católica, o Vaticano solicitou, em 2016, depoimentos de pessoas que viveram entre as décadas de 1940 e 1980, relatando graças alcançadas e sobre a consciência popular de seu martírio. Com a aprovação da Comissão dos Teólogos, a fase mais longa do processo, restou aos bispos discutirem a aprovação da beatificação da menina para, em seguida, encaminhar para o Papa Francisco, que autorizou em 2019.

PADRE CÍCERO
A experiência de beatificação de Benigna também pode contribuir com o processo de um outro santo popular importante para o Cariri: Padre Cícero. Esta é a visão do Padre Zé Vicente, promotor de justiça no caso de Benigna.

“Mediante esse trabalho desenvolvido [com Benigna], a gente adquire mais experiência, mais possibilidade, alargamos nosso campo de visão e capacidade de compreensão, a sensibilidade para captar informações que chegam dos fiéis, dos testemunhos, da leitura de documentos, de tudo aquilo que pode ser requisitado para fundamentar os argumentos iniciais que a Diocese apresenta para a fama de santidade”, justifica.

Enquanto os fiéis de Santana do Cariri estão em contagem regressiva, os milhares de romeiros nordestinos receberam com muita alegria o anúncio da autorização do processo de beatificação do Padre Cícero, no último dia 20. Agora “servo de Deus”, o patriarca de Juazeiro do Norte gera grande expectativa desde que teve início uma revisão histórica de sua vida para conseguir sua reconciliação com a Igreja Católica, em 2001.

Apenas a abertura da causa de beatificação do “padrinho”, como é carinhosamente conhecido, já é marcante. O sacerdote, um dos protagonistas do chamado “Milagre de Juazeiro”, quando a hóstia se transformou em sangue na boca da beata Maria de Araújo, ficou muito próximo de ser excomungado da Igreja, em 1916, mas a sentença não chegou a ser executada.

“Sei que seu processo de santidade ainda leva tempo, mas para o romeiro nordestino ele já é santo”, comemora Paulo Eduardo Magalhães, romeiro de Macaíba, no Rio Grande do Norte. O sentimento é compartilhado com Jucineide Ventura, romeira de Garanhuns, em Pernambuco. “Ficamos muito felizes com a notícia, mas eu já o tenho como um santo. Tenho muita fé. Já alcancei muitas graças.”

Contudo, o processo de beatificação do sacerdote deve durar alguns anos. Outros cinco cearenses também postulam o “título de beato”, tendo como caso mais antigo o de Francisca Benícia Oliveira, a Irmã Clemência, natural de Redenção, que é conduzida pela Arquidiocese de Fortaleza, desde 1975. No caso do Padre Cícero, a causa ainda passará por muitas etapas, como a fase de inquérito, onde se investiga suas virtudes cristãs, espirituais e humanas.

Após isso, será necessária a comprovação de um milagre, passando inclusive pela avaliação de um médico. Como o andamento de todos os processos são sigilosos, o advogado e especialista em direito canônico José Luís Lira conta que não dá para ter uma previsão. “É demorado, porque tem suas regras. Depois de entregue, a documentação é analisada por uma comissão de estudiosos e passa por várias comissões.”

[ Mais notícias ]