O 9º Boletim Desigualdade nas Metrópoles, produzido em uma parceria entre a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), o Observatório das Metrópoles e a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedOdsal), aponta que a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) concentra 1,27 milhão de pessoas vivendo na linha da pobreza.
O número corresponde a pouco menos de 10% do acumulado do Brasil, estimado pelo estudo em 19,8 milhões de pessoas. Entre 2020 e 2021, por exemplo, o número de pessoas, na Grande Fortaleza, vivendo na pobreza passou de 1,03 milhão para 1,27 milhão. Na extrema pobreza, o total passou de 217,51 mil para 232,23 mil, tendo renda domiciliar per capita abaixo de R$ 160.
Na avaliação do professor do Programa de Pós-Graduação em Economia Rural da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenador do Laboratório de Estudos da Pobreza, Vítor Miro, o aumento no número de pessoas em situação de pobreza ocorreu em todas as dimensões geográficas, em todos os estados e nas grandes cidades brasileiras.
Os especialistas ouvidos pelo OPINIÃO CE avaliam também que, por mais que os efeitos da pandemia elevem automaticamente os números da pobreza em Fortaleza e em mais 18 municípios que compõe a RMF, o que mais está pesando nos números é a inflação brasileira somada ao desemprego. Durante os dois últimos anos, o mercado de trabalho, principal fonte de renda das famílias brasileiras, foi muito afetado.
“Em 2020, o Auxílio Emergencial foi bem-sucedido em minimizar os impactos da recessão sobre os indicadores de pobreza. Em 2021, tivemos uma versão do Auxílio Emergencial mais restrita, tanto de público-alvo, quanto de valores transferidos. Muitas famílias tiveram renda inferior à linha de pobreza. Outro fator que devemos considerar nesse cálculo é o efeito da inflação, que reduz o poder de compra das famílias. Tanto que o efeito mais imediato da condição de pobreza é a insegurança alimentar e a fome”, pontua Miro.
Ainda segundo o docente, o Nordeste, por fatores históricos, concentra uma maior proporção de pessoas em situação de vulnerabilidade. Em momentos de recessão e aumento na proporção de pessoas em situação de pobreza, observa-se um maior impacto na realidade nordestina. “No Ceará também podemos dizer que existe um comportamento diferenciado. A Capital e o restante da RMF possuem atividades econômicas mais dinâmicas, se recuperam de forma mais rápida, no interior do estado e em áreas rurais o cenário é mais grave.”
Quais são as possíveis soluções?
De forma emergencial, a solução, para Miro, seria aplicar políticas públicas de transferência de renda ou de bens alimentícios, tornando-se a forma mais rápida e direta de amenizar os efeitos de uma recessão. Professor doutor em Ciência Política Clayton Medonça reitera que o problema da inflação veio antes da pandemia e antes do Governo Bolsonaro.
“Uma vez que assumiu o presidente Temer, com uma orientação governamental mercadista e neoliberal, acentuou-se ainda mais a desigualdade. O preço dos combustíveis e do gás de cozinha já vinham sendo uma reclamação em 2016 a partir do momento que ele muda a política de preços da Petrobras. Políticas públicas de mais curto prazo podem atenuar o problema. Provavelmente, com esse novo Auxilio Emergencial criado eleitoreiramente vai gerar um alívio momentâneo, embora com a inflação de alimentos elevada.”
A solução, de acordo com Medonça, é o Brasil conseguir gerar empregos de melhor qualidade para se ter uma mudança significativa dos sinais de desigualdades sociais. “O próximo governo que assumirá vai ter que pensar alguma forma de fazer isso a longo prazo. Muito provavelmente terá que renovar esse auxílio. De preferência torná-lo permanente. Por outro lado, vai ter que ser estudado de onde virá esses recursos”, complementa.
Para o economista, diretor de crédito e diretor do Instituto Brasileiro De Executivos De Finanças – Ceará (Ibef-CE), Renato Aguiar, a pandemia comprometeu as atividades econômicas em todos os âmbitos: fechamento de empresas, aumento do desemprego e inflação alta, apesar dos esforços do setor público materializados pelos auxílios e linhas de crédito. As soluções para a diminuição da pobreza não só em Fortaleza, mas no Brasil, segundo o economista, são emergenciais e também que envolvem planejamento a médio e a longo prazo.
Para Renato, a curto prazo, a solução seriam ações de acolhimento, fornecimento de refeições, cuidados com a saúde e cadastramento nos programas sociais do governo. A médio e longo prazo, a disponibilização de cursos de qualificação, incentivos à contratação, balcões de emprego especializados e/ou dedicados somados aos programas estruturantes para a geração de emprego e renda, “capitaneados pelo Governo do Estado e demais iniciativas da União para a recuperação econômica do país e para a redução desse público que vive na pobreza e extrema pobreza, rumo a tão sonhada extinção da miséria no Brasil”, conclui.