Estudiosos ouvidos pelo OPINIÃO CE apontam falhas nas PECs sobre Reforma Tributária e que não há clima para propostas serem votadas ainda neste ano
Ingrid Campos
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O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), articula-se para votar a Proposta de Emenda Constitucional 110/19 (PEC 110/19), da Reforma Tributária, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa na semana que começa neste domingo, 27. Há, ainda, outro texto do tipo pronto para pauta do Plenário da Câmara dos Deputados, a PEC 45/19.
Especialistas ouvidos pelo OPINIÃO CE discordam que as matérias tenham impacto positivo para a população em geral – majoritariamente formada por pessoas pobres – e para os entes federados. É o que diz Carlos Cintra, professor adjunto da Universidade Federal do Ceará (UFC) e especialista em Direito Tributário.
“O problema é que o nosso sistema é do tipo regressivo, ou seja, a maioria dos tributos não levam em conta a capacidade de cada um tem de pagar porque oneram o consumo. Dessa forma, quem ganha menos é mais comprometido”, aponta.
“Imagina: um milionário e um pobre comprando um quilo de arroz pagam o mesmo valor em imposto sobre esse produto. Mas se for comparar esse valor com a renda mensal dos dois, para o pobre é uma parcela significativa, enquanto para o rico, esse tributo desaparece na proporção da sua renda. A reforma continua onerando o consumo, mas o problema é na base da tributação”, completa Cintra, que acredita na tributação sobre renda e patrimônio como um caminho para uma maior justiça fiscal.
TUDO EM IBS
Na proposta que tramita no Senado, há a previsão de criação de um novo imposto, o IBS, que unificaria ICMS, ISS, IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CIDE-Combustíveis e Salário-Educação, entre outras ações. Medidas como essa, na análise de Marcelo Lettieri, do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais – Delegacia Sindical do Ceará (Sindifisco-CE), maculam a autonomia financeira dos entes federados.
“Ninguém quer que outro ente arrecade os tributos e repasse depois os valores. Isso pode ser bom para pequenos municípios que têm dificuldade na arrecadação, mas não para grandes, como as capitais”, explica. A queda na arrecadação, como afirma Cintra, pode piorar a situação fiscal de estados e municípios.
“O Ceará tem as contas equilibradas, mas isso não é regra. Os estados têm problemas fiscais, você conta nos dedos das mãos os com saúde financeira estável. Eles fazem malabarismos junto aos tribunais de conta para conseguir pagar a folha”, conclui.
Assim como Cintra, Lettieri acredita que o mais adequado seria focar na tributação da renda, acabar com a isenção de lucros e dividendos e aumentar a faixa de isenção do imposto de renda, pois são pontos mais consensuais e que daria mais responsabilidade para os mais ricos nesse sistema.
“Essas reformas falam muito na simplificação da tributação, mas as atividades econômicas são complexas. Dificilmente teremos um sistema simples, mas podemos ter um sistema eficaz. O problema é que essas reformas padecem no mesmo problema: o do consumo”, avalia o auditor do Sindifisco.
SEM CLIMA
Os dois especialistas acreditam que não há clima para aprovação das PECs ainda neste ano. Para Lettieri, o fato de várias propostas de reforma tributária serem discutidas ao mesmo tempo dificulta o debate e “gera tantos conflitos que (as mudanças) acabam não avançando.”
“Todos dizem que o nosso sistema tributário é ruim, mas esse é o único consenso. Por isso, acho que o ideal é fazer uma reforma por partes”, afirma. Além disso, o auditor fiscal aponta que o tempo da discussão se perdeu. “É um debate que não dá para fazer em fim de governo, em ano eleitoral. A reforma, agora, está sendo liderada pelo Congresso, não tem força do Poder Executivo para articular esse processo.”
“O ambiente atual não me faz acreditar que propostas que sejam apresentadas assim, no curto prazo, possam reduzir a carga tributária imposta aos menos favorecidos. Não acredito que haja ambiente para qualquer discussão séria e aprovação da reforma agora”, diz Cintra.