A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que perdoa dívidas e anistia os partidos políticos que não cumpriram com as cotas raciais nas eleições anteriores deve ser votada apenas após o recesso parlamentar no Senado. Assim, a previsão é que a matéria siga para votação no mês de agosto, quando os trabalhos dos legisladores é retomado. O recesso tem início nesta quinta-feira (18), e segue até o dia 31 de julho. Na câmara alta do Congresso Nacional, a proposta segue sem relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
O presidente da comissão, senador Davi Alcolumbre (União-AP), informou nesta quarta que está com dificuldades para encontrar um senador disposto a relatar a PEC. “Quase que eu sou relator para ver se aprova logo”, disse Alcolumbre. Quando questionado por jornalista se teria interesse na pauta, respondeu que “confusão só presta grande” e riu. O presidente da CCJ informou que a PEC será votada na primeira sessão da comissão na volta do recesso, em agosto.
Na semana passada, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que não pretende acelerar a tramitação da PEC. “Não há de minha parte nenhum tipo de compromisso de ir imediatamente ao plenário do Senado, com qualquer tipo de açodamento [pressa], em relação a essa matéria”, destacou.
APROVAÇÃO NA CÂMARA
A Câmara dos Deputados aprovou a PEC em dois turnos no último dia 11. Por se tratar de uma mudança constitucional, a matéria precisaria ser aprovada por um mínimo de 308 deputados, em duas votações. Na primeira, foram 344 votos favoráveis, 89 contrários e 4 abstenções; e na segunda, 338 votos favoráveis e 83 contrários, com 4 abstenções. O Senado também vai precisar aprová-la em duas votações com mínimo de 49 votos dos 81 senadores.
A proposta teve votos favoráveis de 17 partidos – do PT ao PL. Assim, apenas três das 20 legendas que possuem representação na Casa não tiveram votos favoráveis à matéria. O Psol, com 13 parlamentares, teve 12 votos contrários e uma abstenção. A Rede, com apenas um parlamentar, teve um voto contrário. E o Novo, com três deputados, teve a totalidade de votos contrários.
Todos os outros 17 partidos tiveram votos favoráveis. Mesmo sendo a legenda com o maior número de “nãos”, o PL possuiu 47 votos a favor da matéria, além de 17 abstenções. A sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro é a maior representação na Câmara. À frente da sigla, entretanto, está o PT, que teve 57 votos favoráveis, apenas três contrários, sete abstenções e uma ausência. O PP (42), o Republicanos (37), o PSD (36), o MDB (30) e o União Brasil (27), seguem na lista como os partidos que mais tiveram votos a favor. Outras siglas como PDT, Podemos, PSB, PSDB, PCdoB, Avante, Solidariedade, PV, PRD e Cidadania também tiveram “sims”.
ANISTIA
Em relação à versão anterior do texto, o aprovado na última quinta deixa de lado a anistia definitiva, sem a incidência de “sanções de qualquer natureza”, pelo não cumprimento das cotas de gênero e racial. No Ceará, a bancada estadual do PL pode ser cassada por descumprimento à cota de gênero. A PEC da anistia poderia beneficiar o partido, mas acabou sendo alterada pelo relator, o deputado Antônio Carlos Rodrigues (PL-SP), na forma de texto substitutivo. Dos 93 parlamentares do partido, 29 foram contrários à PEC da forma como ela foi apresentada.
Segundo a PEC, a aplicação de multa ou a suspensão do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha aos partidos que não tiveram o número mínimo de candidatos negros no pleito de 2022 fica proibida. Conforme o texto, ficou definido em 30% os recursos do Fundo Especial e do Fundo Partidário destinados às candidaturas de pessoas pretas e pardas. A parte do texto vai na contramão de uma resolução atualmente em vigor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de 2020, que determina a aplicação de recursos proporcionais à quantidade de candidatos autodeclarados negros da legenda. O projeto destaca que os partidos destinaram tais recursos “nas circunscrições que melhor atendam aos interesses e estratégias partidárias”. A Federação Psol/Rede propôs em destaque a retirada deste termo, mas foi voto vencido. A porcentagem vai se aplicar a partir das eleições deste ano.
Com a aprovação do projeto, qualquer valor aplicado pelos partidos a título de cotas de recursos para tal população em eleições anteriores serão considerados como cota cumprida, desde que haja a aplicação da diferença em relação à cota que não foi cumprida nas eleições anteriores nas quatro eleições seguintes à promulgação da emenda e a partir de 2026.
PERDÃO DE DÍVIDAS E IMUNIDADE PARTIDÁRIA
A proposta instaurou ainda o Programa de Recuperação Fiscal (Refis) dos partidos políticos. O novo instrumento permite o parcelamento de dívidas tributárias e não tributárias. As tributárias poderão ser divididas em até 180 meses, enquanto débitos com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em até 60 meses. As legendas terão isenção dos juros e multas acumuladas, aplicando-se apenas a correção monetária sobre os montantes originais.
Para pagar as dívidas, os partidos poderão se utilizar de recursos do Fundo Partidário. Isso valerá para sanções e penalidades de natureza eleitoral ou não, devolução de recursos ao Erário ou mesmo devolução de recursos públicos ou privados imputados pela Justiça Eleitoral, inclusive os de origem não identificada, excetuados os recursos de fontes vedadas.
O texto também estende o instituto da imunidade tributária de partidos políticos, seus institutos ou fundações a sanções de natureza tributária, menos as previdenciárias. Com isso, estão incluídos nesta imunidade a devolução e o recolhimento de valores, inclusive os determinados em processos de prestação de contas eleitorais e anuais, incluindo juros e multas ou condenações aplicadas por órgãos da administração pública direta e indireta em processos administrativos ou judiciais.
Isso envolve processos em tramitação, em execução ou transitados em julgado, provocando o cancelamento de sanções, a extinção de processos e o levantamento de inscrições em cadastros de dívida ou inadimplência. A norma envolve também processos administrativos ou judiciais nos quais a decisão administrativa ou a inscrição em cadastros de dívida ativa tenha ocorrido em prazo superior a cinco anos.