*A xilogravura é de autoria do artista plástico autodidata cearense João Paulo José da Silva. Historiador, trabalha com as linguagens artísticas da xilogravura, monotipia, pintura e escultura em madeira. No Instagram, publica no perfil @jp.artesubjetiva
Junho sempre foi um mês que trouxe muitos eventos. Além das festas juninas, eram dois aniversários para comemorar, o da minha mãe e o do meu irmão. O Dia dos Namorados também era uma espécie de acontecimento dos grandes. Especialmente na adolescência, quando as comparações e os hormônios deixam tudo mais dramático.
Quando eu mudei de escola para uma maior, nesse dia era uma profusão de buquês de flores, chocolates e presentes entregues no horário da aula. Uma vez, tinha até um trio de violinos esperando na porta do colégio. O povo caprichava mesmo para surpreender as namoradas.
Por essa época, eu praticamente só namorei uma pessoa e compartilhávamos a liseira e o fato de não sermos herdeiros. Então, a simplicidade era a nossa marca. Eram cartas manuscritas, poesias, desenhos, flores arrancadas dos jardins dos outros e bijuteiras minimalistas. Eu achava fofo.
Depois, ainda tive uma ida ao cinema escondido, com direito a gazear aula, porque meu pai não me deixava namorar. (Eita, agora ele ficou sabendo…). A árvore na frente da escola era nosso local de encontro, antes da aula. Além do porteiro da escola, todos os motoristas e passageiros dos ônibus que passavam na movimentada Avenida do Imperador, no Centro, no horário do almoço, eram nossas testemunhas. Não sei como não recebi uma advertência e nem meu pai chegou a descobrir.
Aos quinze anos, a curiosidade para saber quando eu iria me casar fez com que eu copiasse as mocinhas de outros tempos e arrancasse um fio de cabelo, pegasse uma aliança emprestada e testasse a simpatia de vidência numa fogueira de São João. Compartilhamos a experiência, eu e a minha melhor amiga.
Era só amarrar o fio de cabelo de uma moça em uma aliança benta e colocar em um copo com dois dedos de água em cima da fogueira de São João. Quantas vezes a aliança batesse na borda eram os anos que faltavam para o casamento.
Arrancamos um fio de cabelo nosso, pedimos a aliança da avó dela emprestada e seguimos para a fogueira. Descobrimos quantos anos faltava e deixamos pra lá. E, para nossa surpresa, tudo saiu conforme São João tinha revelado.
Mais adiante, não no mês de junho, eu levei uma queda e caí na lama por pegar uma carona na bike do namorado até a parada do ônibus. Era domingo e as pessoas saíram das suas casas para ajudar a gente a levantar e perguntar se tínhamos nos machucado. Nunca esqueci essa vergonha.
Outra peculiaridade eram os nossos locais de encontro. Aos poucos, deixaram de capinar o mato ao redor da calçada e, ao atravessar para o abraço cotidiano antes de ir para casa, sempre levava comigo nas barras das calças da farda um monte de carrapichos.
Transcorridos tantos anos, essas lembranças me arrancam alguns sorrisos. Parece que tem coisas que a gente vivencia para poder ter o que contar ou mesmo para rir nos momentos tristes. Eu ainda acredito que o amor continua belo, leve e divertido, não importa quanto tempo passe.