A ONG cearense Aquasis conquistou a licença para trazer o peixe-boi Tico de volta para o Brasil. O anúncio foi feito nesta quinta-feira (25) através das redes sociais do projeto. Desde 2022, o animal estava sob cuidados na Venezuela após se afastar da costa brasileira. Agora, a entidade pede ajuda aos órgãos públicos brasileiros para transportar o animal em total segurança para o Ceará.
“Não temos assegurada uma aeronave para o transporte de Tico dentro do Brasil e essa é a parte crucial que ainda nos falta. Trazer Tico de volta é importantíssimo. Ele ainda tem chance de ser integrado ao programa de conservação da espécie no Brasil e, com uma nova soltura, poderá realizar seu papel ecológico na natureza. Contribuindo em diferentes aspectos e, principalmente, ajudar a população de sua espécie”, informa a nota da entidade.
FUGA DO BRASIL
Durante sete anos, o peixe-boi permaneceu em reabilitação no Centro de Reabilitação de Mamíferos Marinhos da Aquasis, em Caucaia, sob cuidados humanos, após ser resgatado no litoral cearense. Em 2022, o animal foi solto nas imediações do cativeiro, com um transmissor que permite seu rastreamento preso a sua cauda. Alguns dias após a soltura, Tico se deslocou para águas profundas, ainda no Ceará, o que levou a equipe a decidir pelo seu resgate, uma vez que peixes-bois são animais costeiros, que se alimentam de plantas encontradas em águas rasas, e sua sobrevivência estaria ameaçada.
Devido ao seu rápido deslocamento, o resgate se tornou cada vez mais difícil. A equipe acompanhou a movimentação do animal por terra, através dos sinais de GPS emitidos pelo equipamento, e tentou articular embarques desde o Ceará ao Amapá, porém sem sucesso, devido à grande distância da costa e ausência de condições logísticas favoráveis e seguras para realizar a operação. O animal atingiu águas internacionais, na altura da Guiana Francesa, o que limitou ainda mais os esforços de resgate. Com o passar dos dias acreditava-se que o animal pudesse ter morrido, devido às condições de alto mar inóspitas para um peixe-boi.
Os sinais do transmissor continuaram sendo monitorados para avaliação de estratégias para a sua recuperação e melhor compreensão dos fatos. Por volta do dia 22 de agosto de 2022 foi verificada a aproximação da costa de Trinidade e Tobago. Pesquisadores do país foram contatados e auxiliaram na verificação do equipamento após o repasse das coordenadas geográficas. Surpreendentemente, em agosto, colaboradores locais confirmaram que o animal estava vivo, na costa da ilha de Tobago.
De acordo com especialistas, além dos fatores relacionados ao bem-estar e sobrevivência de Tico, o seu retorno para o Brasil é fortemente indicado, uma vez que as populações mais próximas de onde ele está, possuem características genéticas diferentes e pertencem possivelmente a outra espécie distinta da encontrada no nordeste do Brasil. Dessa forma, uma reprodução entre estes animais de populações ou até mesmo espécies diferentes poderia acarretar efeitos deletérios a médio prazo para os peixes-bois locais.
RETORNO PARA O BRASIL
Desde quando Tico chegou à Venezuela, a ONG cearense se mobilizou para iniciar os trâmites para a sua repatriação, o que incluiu tratativas com ambos os governos. Além disso, especialistas em mamíferos aquáticos do ICMBio, órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, solicitaram uma consulta a especialistas internacionais em sirênios para auxiliar na tomada de decisão sobre o destino do animal. Apesar do posicionamento favorável do ICMBio e IBAMA, é necessário que o MMA solicite o contato com o governo da Venezuela por meio do Ministério de Relações Exteriores (MRE).
Devido à situação, o processo de importação do Tico está, no momento, paralisado. O animal já está no cativeiro na Venezuela, com chances decrescentes de conseguir voltar à natureza e cumprir suas funções ecológicas. Os protocolos do ICMBio recomendam a soltura de animais até os 10 anos. Em nota, a Aquasis informa que “as autoridades brasileiras continuam vendo esse tempo passar sem nada fazer”.
“Este relato é um pedido de ajuda para que o caso do Tico ganhe visibilidade e chegue até as esferas governamentais federais, as únicas que podem dialogar com o governo venezuelano a fim de que seja iniciado o processo para trazermos Tico de volta ao Brasil”, informou a Aquasis.
PEIXE-BOI TICO
O peixe-boi Tico foi resgatado pela equipe da ONG Aquasis, em 2014, quando ainda era um recém-nascido, após encalhar na Praia das Agulhas, em Fortim, no Ceará. Os encalhes de filhotes dessa espécie são mais frequentes no litoral semi-árido do nordeste, nos estados do Ceará e Rio Grande do Norte, devido à perda de áreas favoráveis para as fêmeas parirem e cuidarem das suas crias. Por se tratar de uma espécie ameaçada de extinção, que conta com cerca de 1100 indivíduos no país, a reabilitação e posterior soltura desses indivíduos representa uma das principais estratégias para a recuperação das populações e a sua conservação.