
É um movimento comum deixar o Interior para morar na Capital. Não há nenhuma família que não tenha pelo menos um integrante “fora do ninho.” A fluidez da vida faz com que muitos percorram o caminho rumo à cidade grande. Foi assim no passado e continua hoje, ainda que em menor intensidade, já que muitos fazem atualmente o caminho de volta.
Aqueles que deixaram a casa de morada, levaram na mala muitos sonhos, planos e também memórias e saudades. Quando se finca raízes em outras terras, há sempre associações que nos fazem manter o vínculo com o nosso lar de nascença, aquele onde enxergamos as primeiras cores, sentimos os primeiros cheiros e degustamos os primeiros sabores.
São memórias que fazem parte da formação da nossa personalidade, de quem somos em essência. E isso é tão forte que, mesmo involuntariamente, somos chamados ao passado e revivemos momentos por um som, um cheiro ou uma imagem. Estes dias, ao saborear um café num espaço lindo de Fortaleza, me peguei olhando para uma parede cuidadosamente decorada com miniaturas do sertão. Foi imediata a conexão entre minha mente e meu coração. Viajei para o Crato.
Havia pequenas formas de alumínio, que me fizeram sentir o sabor dos bolos feitos por minha tia Águida. Havia colheres de pau que remeteram a minha amada madrinha Vera, mexendo o panelão de canjica. Aquele cheiro adocicado de milho que aguça o paladar e aquece a alma.
Meus olhos continuaram passeando pela parede e pararam no ralador de coco manual, preso a uma tábua de madeira decorada com um tecido pintado a mão. A imagem diz tanto sobre minha cidade…Ela tem simplicidade e arte.
Dois azulejos emoldurados em madeira me levaram para a cozinha da casa de minha avó Erice, onde vivi momentos únicos de aprendizado, prosa e poesia regados ao melhor café do mundo, o café de vó. Na parede, também havia candeeiro, chocalho, canecas de ágata, peneira de palha, sanduicheira de alumínio… cada uma daquelas peças me fazia viajar no tempo e nas sensações.
Minha memória percorreu praças, sítios, casas, ruas… e tentei calcular o quanto do interior existe em mim. Muito!
Daí, entendi que os lugares conversam entre si por objetos e sensações… Esses mesmos lugares fazem com que a história seja perpetuada e as referências mantidas. Olhe com atenção, enxergue o que faz sentido pra você, abra a sua mala e revisite o seu lugar no mundo.