Vez por outra vou ao Estádio do Terra e Mar, no Mucuripe. Gosto do ambiente. Do outro lado do portão principal, muros separam as casas do campo. Dentro das casas, os quintais. Plantadas nos quintais, as árvores. Em cima das árvores, as frutas e os meninos.
Passei minha infância, adolescência e parte da juventude num subúrbio do Rio de Janeiro. Morava no Bairro Vista Alegre. Como sugere o nome do local, era divertido. Seu Joaquim passava gritando “Garrafeiro!” e seu Manoel era verdureiro e entregava em domicílio.
Os brasileiros frescavam com os portugueses. Alguns deles eram donos de mercearia e de bodegas onde os moradores faziam suas compras e anotavam num caderno. Tinha também o padeiro num triciclo, o amolador de facas, a bananeira e a goiabeira.
As casas do conjunto residencial eram todas iguais. Pintadas de branco com janelas azuis. Com o tempo, os moradores mudavam a estrutura e a cor pintando a seu gosto. No fundo da casa, o quintal e, como no Terra e Mar, por trás da casa o campo de futebol.
Aos nove anos, fiquei um mês de férias sem sair de casa por ter aprontado na escola. Quando meus padrinhos saíam, subia na goiabeira, que era mais alta que o muro, para dar uma olhada na pelada que rolava até o anoitecer. De repente, um grito: “Desce daí”.
Virei para dentro do quintal e, com o susto, uma revelação. Duas bananeiras em linha afastadas um metro e meio. Era só apoiar um cabo de vassoura entre as duas e a meta estava pronta. Dei margem à imaginação e um goleiro travestido de lata de lixo ocupou o seu lugar.
Desci sorrindo da goiabeira. Estava tudo pronto na cabeça. Sabia que faltava a bola, mas não era problema. Peguei folhas de jornal, embolei uma na outra e soquei numa meia até ganhar uma forma arredondada. Depois, amarrava a bola para que ela não desintegrasse.
Vasco e Flamengo se enfrentaram várias vezes no quintal da minha casa. Pinga representava o Vasco e Dida, o Flamengo. Cada um tinha direito a vinte chutes. Vez por outra, o dedão do pé direito estava inflamado por raspar na terra. Foi assim que aprendi a usar o pé esquerdo.