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22 de março de 2025

Luciano Maia renuncia assento na ACL e critica cenário das Academias de Letras: “Estão distantes de seus objetivos”

O poeta que ocupava desde 1999 a cadeira de número 23 da ACL enviou a carta de renúncia no último dia 8 de maio; ao OPINIÃO CE, ele destacou que não houve nenhum “motivo especial” para tal, mas “uma tomada de consciência sobre o que se tornaram as academias”
Poeta, prosador e tradutor Luciano Maia. Foto: Divulgação/Ideal Clube

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O poeta, prosador e tradutor cearense Luciano Maia renunciou da sua cadeira na Academia Cearense de Letras (ACL). Ex-professor universitário, ele enviou sua carta de renúncia no último dia 8 de maio. Ao OPINIÃO CE, Maia destacou que não houve nenhum “motivo especial” para a sua decisão, mas “uma tomada de consciência sobre o que se tornaram as academias”. De acordo com o poeta, as Academias estão se transformando em clubes, “onde os mais prestigiados social e economicamente vêm tomando lugar de poetas e escritores”, cenário que ele afirma ser irreversível e estar ocorrendo no mundo inteiro.

“Infelizmente, as Academias – não só a Cearense, mas é um fenômeno nacional e até internacional – vêm se tornando locais para reuniões, no meu entendimento, distantes dos objetivos de divulgação e valorização da cultura e da língua portuguesa”, disse, ressaltando ainda que os estatutos das instituições prezam por esses objetivos.

Natural de Limoeiro do Norte, município na Região do Vale do Jaguaribe, Luciano entrou na ACL em 1999. Na instituição, ele ocupava a cadeira de número 23, que tem como patrono o poeta, contista e dramaturgo Juvenal Galeno. Outros nomes como José Sombra Filho, Elias Mallmann, Henriqueta Galeno e Florival Seraine também passaram pela cadeira.

“DISTANTES DE SEUS OBJETIVOS”

Segundo o poeta, ainda em entrevista ao OPINIÃO CE, quando ele entrou na ACL havia uma preocupação com o currículo literário, mas, como explicou ele, essa preocupação foi se dissolvendo. “Foi se arrefecendo. E ao deixar de existir, deixou que se tomasse lugar um reconhecimento social um pouco distante dos objetivos de uma Academia de Letras”.

Luciano Maia citou o professor cearense e ex-arquiteto Liberal de Castro, que apresentou uma teoria sobre a transformação no quadro das Academias de Letras. “[Liberal de Castro] dizia o seguinte: as pessoas bem postas da vida, comerciantes ou industriais, quando ganhavam uma certa idade, queriam que o seu nome ficasse perpetuado pelo menos na cidade onde viviam e procuravam os clubes sociais para deles se tornarem diretores ou mesmo presidentes”. No entanto, conforme Luciano, os clubes começaram a “perder terreno” para outras instituições.

“Os grandes empresários e pessoas dessa área, já que os clubes sociais começaram a perder prestígio, começaram a voltar a sua atenção para as Academias”, afirmou. “E o professor Liberal dizia isso no sentido de ressaltar a preocupação muito mais social e de prestígio econômico-financeiro do que propriamente literário”, completou.

Luciano afirmou que ainda há atividades como seminários e palestras, que possuem um cunho histórico-cultural da literatura, mas demonstrou preocupação com o futuro. “Parece que é um processo que vai terminar por transformar as academias em reuniões de homenagens”. Como reiterou o poeta, no entanto, isso não acontece apenas no Ceará. “É um fenômeno que vem ocorrendo em todo o Brasil e também no mundo”. Ele afirma, ainda, acreditar que a existência das Academias está vinculada ao “novo conceito”. “[As Academias] perderam a sua finalidade precípua”. Segundo ele, há quatro ou cinco décadas, os projetos eram mais vinculados aos interesses e objetivos precípuos dos estatutos das Academias.

O cenário não preocupa para o futuro da literatura no Ceará. “O futuro da literatura não está vinculado às Academias. E quanto mais o tempo passa, mais isso vai ser verdade”, explicou. “O futuro da literatura está vinculado aos talentos, ao exercício sério da literatura, ao culto à poesia, à prosa, ao romance, ao conto e à crônica. [Está] menos vinculado, cada vez mais, a essas reuniões que não têm muito apreço pela literatura”.

LUCIANO MAIA

Luciano Maia nasceu em 7 de janeiro de 1949. Com formação de advogado, preferiu se dedicar aos estudos linguísticos e à literatura, cenário que o garantiu uma cadeira na ACL, em 1999. No seu ingresso à Academia, foi saudado pelo então presidente, poeta Artur Eduardo Benevides. Foi ainda professor de História da Arte e de Monografia Jurídica na Universidade de Fortaleza (Unifor), e é Mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Dentre suas publicações, possui mais de 20 títulos de poesia e prosa, como “Jaguaribe – Memória das Águas”, que alcançou a 11ª edição brasileira e com traduções em romeno, espanhol e inglês. Luciano traduziu ainda poetas da Romênia, entre os quais Mihai Eminescu, Lucian Blaga, Mihai Sadoveanu e Marin Sorescu, além de peças literárias do folclore romeno, como Mioritza e a Lenda do Mestre Manole. Seus poemas estão presentes em antologias brasileiras e internacionais, como na Antología de la Poesía Brasileña (Santiago de Compostela, Espanha, 1999), Poemele Latinitaţii (Craiova, Romênia, 2004), De lune et d’eaux (Bouchemaine, França, 2013).

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