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15 de fevereiro de 2025

Inventário do caminho

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Nesse dia, não foi uma luta para abrir os olhos e sair da cama. Era um dia novo. O primeiro dia da semana de um novo tempo que eu queria inaugurar.

Não mais pensar no que não depende de mim, nem criar expectativas. Apenas fazer o que me cabe, da melhor maneira que eu puder.

Respirei fundo, olhei para os meus pés e segui para acordar o menino grande que dorme ao meu lado, com medo de pesadelos.

Roupas arrumadas na véspera dispostas no sofá. Seguimos para os banheiros para nos aprontarmos para nossos afazeres. Ele ia começar mais um ano na escola de sempre. O quarto ano do Ensino Fundamental. À contragosto, voltou para o sistema integral. Eu também não queria, mas o que fazer se eu trabalho o dia inteiro? O irmão também vai estudar o dia todo. Então, não temos muita escolha.

Eu, de tênis e roupa de academia, iria caminhar até a Lagoa do Tabapuá. Era a atividade física possível, dado o aperto de tempo.

Nos arrumamos rápido, colocamos as mochilas nas costas e tomamos um suco no lanche do Léo. Ao comprar o suco no trailer ao lado, uma gata branca com olhos de cores diferentes mostrava todo o seu poder de sedução no balcão. Depois de dar uns carinhos em seu pelo macio, continuamos o nosso caminho.

No mato da BR, as chananas ainda não haviam aberto, nem os pequenos lírios que brotam em cima do capim. Meu mato preferido estava sendo devorado por lagartas listradas em verde, preto e branco. Como elas eram peludas, resolvi não arriscar em levar para casa para ver qual borboleta ia nascer.

Algumas árvores de flores brancas pelo caminho, mas nenhum gato novo apareceu. Chegamos na escola, uns beijos na despedida e me encaminho para a passarela. Meu pé de jasmim amarelo está carregado de botões. Um céu riscadinho de nuvens retas, do jeito que eu acho mais lindo. Presente que só Deus é capaz de me dar.

Alargo o sorriso e subo a passarela. O senhorzinho que mora lá agora armou uma rede. Desistiu de dormir em um colchão no chão. Desço apressada e noto que já tem flor nos cajueiros. Meio apressada essa árvore. Atravesso a Avenida Dom Almeida Lustosa e dou de cara com a lagoa entupida de aguapé. Um som constante de insetos parece querer brigar com o dos carros. Procuro o pedaço de cimento em que a garça solitária costumava pousar. Tem até capim em cima.

Avisto uma garça parada na grade de proteção. Me apresso. Será se eu consigo fotografar? Ah, ela voou. Que pena. Os aguapés são tão guerreiros que suas sementes brotam até nas grades. Como assim nascer uma planta num arame? Qualquer umidade, ele já aproveita. Aí sabe sobreviver!

Volto pelo mesmo caminho, olho a hora e tenho a certeza de que não vai dar para ir na academia nesse horário, nem que eu queira. Chego na minha rua, como o pão de queijo com o café com leite de sempre. 7h40! Já estou quase atrasada, não vai dar tempo de lavar o cabelo. Em casa, escolho um vestido florido, tomo um banho super rápido, me perfumo e antes de sair, percebo que não sei aonde eu coloquei meu cartão, nem o passe para pegar o ônibus. Depois de uns cinco minutos, acho em uma das bolsas. Saio para a rua, respiro fundo outra vez e, mesmo andando mais ligeiro, percebo o sol queimando um pouco meu corpo. Gosto da sensação.

Pego o ônibus, olho as mensagens, começo a trabalhar no telefone mesmo. Nos fones, uma cantora entoa a canção do Jorge Camargo. Tudo passa! Então, não deveria me afobar com meus sentimentos e expectativas. A vida flui, independente do que a gente force. Vou confiar no que o Deus que me presenteia com flores vai me trazer para esse fevereiro que começou.

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