Desde meados de 2023, o PT vem se organizando para construir candidaturas para as Eleições Municipais de 2024. A tarefa do partido, no entanto, nem sempre é feita de forma pacífica. Em municípios como Fortaleza e Caucaia, a decisão parte dos Diretórios Municipais, seja para a definição do candidato do partido por meio de votações internas ou por entendimento conjunto dos integrantes. Já em cidades menores como Cascavel, Iguatu, Crato, Icó e Nova Olinda, o PT Ceará tem se imposto sobre as Executivas Municipais do partido. O caso tem sido motivo de conflito entre as lideranças estaduais e locais, chegando a levar a desfiliações.

De acordo com resolução divulgada pelo Diretório Nacional do PT para as eleições de 2024, a tática eleitoral tomada pelo partido em municípios com até 100 mil eleitores será submetida à Executiva Estadual, que terá “a palavra final”. No Ceará, segundo o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE), apenas cinco cidades possuem número de eleitores superior a essa linha de corte: Fortaleza (1.766.078 eleitores), Caucaia (243.392), Juazeiro do Norte (197.116), Maracanaú (174.940) e Sobral (150.361). Em todas as outras 179 cidades cearenses, o PT Ceará é quem define a tática e as candidaturas tomadas pela sigla.

No Ceará, o PT Ceará é presidido por Antônio Filho “Conin”. O dirigente é proximo de lideranças como o ex-governador e atual ministro da Educação, Camilo Santana. O ex-chefe do Executivo cearense é tido por muitos como o principal líder político do Estado. Petistas como a deputada federal Luizianne Lins, no entanto, já teceram críticas ao ministro pela forma com que o partido tem sido liderado no Ceará. O ex-governador e ex-ministro Ciro Gomes (PDT), opositor do Governo Elmano de Freitas (PT), fala em “ditadura” promovida por Camilo no Estado. Camilo prefere não responder às críticas, e dentro e fora do PT não falta quem saia em sua defesa. O OPINIÃO CE tentou contato com Conin, mas não houve retorno até o fechamento.

IMPOSIÇÕES DO DIRETÓRIO ESTADUAL DO PT

No Litoral Leste, Cascavel é uma das cidades em que o partido vem passando por um momento conturbado. Neste mês de abril, o vice-presidente do Diretório Municipal, Estevão Mustafa, anunciou que ele e outros nove integrantes da Executiva renunciaram de suas funções, das quais estavam assegurados até 2025. Ao OPINIÃO CE, ele destacou que o motivo foi o não cumprimento de acordos por parte do prefeito Tiago Lutiani (ex-Tiago Ribeiro) – filiado ao PT em 2023 e anunciado como presidente da Executiva no lugar exatamente de Mustafa.

“[Acordos] desde espaço na gestão até, por exemplo, a questão de viabilizar uma candidatura do nosso grupo, que estava no PT desde o início desse Diretório, para vereador. Ele não garantiu isso, porque ele filiou três vereadores que não eram do PT. Isso inviabilizou qualquer disputa de qualquer pessoa do nosso grupo a uma vaga lá na Câmara Municipal de Cascavel”, disse Mustafa, que era pré-candidato ao Legislativa, mas retirou o seu nome da disputa. Ele disse não conhecer envolvimento do Diretório Estadual na decisão de filiação dos três vereadores que não compõem o seu grupo ao PT.

Integrantes que deixaram o Diretório:

• Estevão Mustafa – Vice-presidente;
• Lidiana Custode – Secretária de Organização;
• Naíme Tavares – Secretária de Formação Política;
• Gaia Tavares – Suplente do Diretório;
• Samila Carvalho – Conselho Fiscal;
• Hugo Machado – Comissão de Ética;
• Magda Sales – Comissão de Ética;
• Francisco Ednardo – Suplente da Comissão de Ética;
• Cláudio Ribeiro – Suplente da Comissão de Ética;
• Outro ex-integrante preferiu não divulgar seu nome.

Apesar de terem deixado o diretório, eles continuam filiados ao PT. O prefeito Tiago Lutiani foi eleito pelo Cidadania em 2020, mas se filiou ao PT em maio de 2023, em um movimento organizado pelo Diretório Estadual. “[Ele] não tem alinhamento ideológico com o partido”, reclama Mustafa. Em seu segundo mandato desde que assumiu Cascavel em eleição suplementar em 2019, Ribeiro não poderá concorrer neste ano e deve anunciar quem será o nome postulante à sua sucessão. O OPINIÃO CE tentou contato com o prefeito, mas não houve retorno até a publicação desta matéria.

Em Icó e Nova Olinda, assim como ocorreu em Cascavel, os prefeitos se filiaram ao PT durante o exercício de seus mandatos. Laís Nunes, prefeita de Icó ex-pedetista, teve a aprovação de sua adesão à sigla anunciada no dia 15 de dezembro de 2023. A chegada da gestora, no entanto, não foi aprovada pelo Diretório do partido no município. O PT de Icó negou que tenha sido consultado sobre a migração de Laís. Em nota pública, o Diretório afirmou que a “gestão Laís Nunes não tem nada a ver com o jeito PT de governar, pois suas ações não coadunam com os ideais do partido, distanciando-se dos princípios voltados para a luta dos trabalhadores e a conquista dos seus direitos”.

“Repudiamos veementemente a filiação da prefeita e de qualquer outro membro do grupo da família Nunes no Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de Icó. Não obstante, entendemos que o apoio político/administrativo do grupo da prefeita aos governos do Estado e do Brasil independe da sua filiação ao PT”.

Em Nova Olinda, a situação foi semelhante. O Diretório Municipal votou de forma contrária à filiação do prefeito Ítalo Brito, até então do PP. “Informamos que a decisão da Executiva Estadual não conta com a concordância do Diretório Municipal. O grupo seguirá firme na oposição”, diz a nota, divulgada pela presidente da Executiva e então candidata do partido nas Eleições Municipais de 2020, Socorro Matos. Ex-vereadora, a ex-presidente do Diretório decidiu renunciar do posto no dia 24 de outubro de 2023. Junto a ela, todos os integrantes da Executiva deixaram seus cargos.

À época da desfiliação, o Diretório emitiu uma nota no qual afirma que o PT em Nova Olinda sempre foi um partido constituído por “pessoas do povo”. “É um partido que teve durante todos esses anos, em seus quadros, pessoas que a partir da formação política, da qualificação proporcionada aos militantes, conseguiram se projetar socialmente, acumular capital político. O PT é isso. Um partido que está com o povo simples, mas que também deseja melhorias para cada ser humano que nos rodeia. Cada projeto que apresentamos visa o bem comum”, escreveu a Executiva.

“Infelizmente, as conjunturas que se constituíram nos últimos meses não possibilitam a permanência desse quadro histórico que fundou e mantém o PT firme e forte em Nova Olinda. As figuras que agora se dizem petistas são as mesmas que quando ocorreu o impeachment da presidenta Dilma e a prisão do Lula, bradavam que petistas eram ladrões. Essas pessoas não defenderam as últimas campanhas do PT, pois têm viés bolsonarista. Agora, por mero oportunismo, se dizem petistas. Nunca serão! O povo de Nova Olinda sabe quem carrega a marca do PT”, acrescentou o texto.

Após a renúncia, foi realizada uma nova eleição, no qual a sindicalista Corrinha do Sindicato assumiu a presidência do Diretório Municipal. Ela é secretária na gestão do prefeito Ítalo. Com a chegada de uma nova Executiva, o PT do município filiou Leonardo Brito, primo de Ítalo, para tentar ser o sucessor da gestão, já que o atual gestor não pode se reeleger neste ano de 2024.

Em Iguatu, o conflito afetou até mesmo liderança histórica do partido na cidade. O empresário Sá Vilarouca, até o final do ano passado, era colocado como pré-candidato por integrantes da sigla no município. No entanto, em decisão do PT Ceará contestada por petistas iguatuenses, o partido filiou Ilo José Neto, filho do deputado estadual Agenor Neto (MDB), para ser o pré-candidato na cidade. O PT de Iguatu denomina Ilo, até então filiado ao PSB, como “bolsonarista”.

“A decisão essa que tem claras intenções de tentar interferir em uma decisão democrática construída pelos filiados e filiadas desse partido no município de Iguatu“, diz nota do PT Iguatu.

Após a migração do filho de Agenor ao PT, Vilarouca deixou o partido, se filiando ao PSB. No partido socialista, com filiação ao lado do senador Cid Gomes e do deputado estadual Marcos Sobreira (PDT), o empresário foi anunciado como pré-candidato ao pleito majoritário pelo partido.

MUNICÍPIOS EM QUE A DECISÃO CABE AOS DIRETÓRIOS MUNICIPAIS

Em Fortaleza, apesar do pré-candidato – e provavelmente candidato até as eleições – escolhido pelo partido, o presidente do Legislativo cearense, Evandro Leitão, não agradar todo o eleitorado petista fortalezense, a decisão saiu de forma democrática, por meio da realização de um Encontro Municipal.

Além dele, outros quatro pré-candidatos disputavam o posto: os também deputados estaduais Larissa Gaspar e Guilherme Sampaio; o ex-deputado federal e atual assessor para assuntos municipais do Governo do Ceará, Artur Bruno; e a deputada federal e ex-prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins, que era a principal adversária de Evandro na disputa. A ex-gestora, aliás, foi a única que não definiu que apoiará o nome do presidente do Legislativo após ele ser definido como o postulante petista.

Após a decisão, no último dia 7 de abril, Luizianne chegou a comentar que “influências externas” interferiram nas eleições internas do PT na Capital. A denúncia foi feita por meio de nota, publicada logo após a divulgação do resultado. Aliados da ex-prefeita criticaram o resultado do encontro. Lêda Vasconcelos, filiada ao PT há 43 anos, disse que “o PT saiu derrotado”.

Já em Caucaia, segundo maior município do Estado e localizado na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), a definição do nome do então secretário da Articulação Política do Governo do Ceará, Waldemir Catanho, como o postulante ao cargo, foi definida pelo PT de Caucaia sem a necessidade dos trâmites democráticos. Em Maracanaú, o PT municipal optou por apoiar o atual prefeito, Roberto Pessoa (União Brasil). O deputado estadual Júlio César Filho (PT), o “Julinho”, ainda tenta se lançar como candidato no município, mesmo com a decisão do Diretório Municipal.

Em Juazeiro do Norte, o deputado estadual Fernando Santana (PT) foi definido como o pré-candidato do partido para tentar tomar o cargo hoje exercido por Glêdson Bezerra (Podemos). Tanto o Diretório Municipal como o Estadual apoiam o nome de Santana como postulante ao Executivo. Em Sobral, outro município que a decisão cabe à Executiva Municipal, o Diretório aprovou por unanimidade a permanência na aliança com o PSB, mas ainda reivindica a manutenção da vaga de vice-prefeito na chapa, atualmente ocupada por Christianne Coelho. O prefeito Ivo Gomes (PSB) tem entrado em conflitos com sua vice, mas o irmão do gestor, senador Cid Gomes (PSB), vem articulando a aliança PT-PSB para tentar resolver os atritos.