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5 de maio de 2024

Fortaleza e seus parques urbanos que deixam a desejar

Foto: Natinho Rodrigues

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Priscila Baima
priscila.baima@opiniaoce.com.br

Em Fortaleza, são quase 3 milhões de habitantes espalhados em 121 bairros, divididos numa área de mais de 300 km², segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE). Sendo a quinta maior cidade do país, a Capital cearense, que recentemente completou 296 anos, tem mudado bastante quando o assunto é sustentabilidade. Esta que, segundo especialistas, possui três pilares: sociedade, economia e meio ambiente. Apesar dos avanços, sobretudo nos últimos anos, Fortaleza ainda deixa a desejar quando o assunto é praças e parques urbanos. Atualmente, a capital conta com mais de 25 parques urbanos e cerca de 500 praças, mas a maioria ainda não atende a população de forma satisfatória. Pensando nisso, o Opinião CE ouviu moradores e especialistas no assunto para saber as principais reivindicações dos fortalezenses e as possíveis soluções para o que ainda precisa ser feito pela atual gestão.

Um dos espaços mais tradicionais para quem mora no bairro São João do Tauape, quando se trata de área verde, é o Parque Rio Branco. Com mais de duas décadas de impasses sobre seu destino, o local atualmente não recebe muitas pessoas devido à sensação de abandono que ele traz para quem se aproxima. Mesmo assim, ainda tem quem frequente o local por gostar e por faltar opções na região. É o caso do funcionário público, Armando Nunes, de 62 anos.

“Sou um frequentador assíduo do Parque Rio Branco. É um local muito bom, uma dádiva da natureza, porém está abandonado. Requer segurança, manutenção e iluminação. Nos últimos anos, a gestão pública não deu muita importância a certos lugares públicos, mesmo assim, como eu gosto muito de lá, sigo frequentando. Todavia, é como se a gente estivesse passando por um perrengue”, pontua Nunes, desesperançoso.

Um dos problemas que Nunes reivindica envolve também as pontes do local. “Um dos problemas do espaço são as pontes feitas de madeira. No inverno, a madeira apodrece e é um risco para as pessoas idosas, por exemplo, ultrapassarem. Outro ponto é a iluminação pública. Os vândalos quebram as lâmpadas e a reposição demora bastante. Por fim, antes existia a Guarda Municipal que dava uma segurança relativa ao parque. Hoje, já não vemos mais”, revela.

Em outro ponto da cidade, no bairro José Walter, na Regional 8, a reclamação é semelhante no que diz respeito à sensação de insegurança e falta de manutenção. A publicitária Laís Peixoto opta sempre por se locomover até outro bairro para aproveitar outras praças e parques.

“Aqui no José Walter possuímos, em cada etapa, uma área de lazer, porém todas elas possuem deficiência na questão de iluminação e conservação dos brinquedos, bancos, asfalto, entre outros. Isso faz com que a gente não tenha o básico para a coletividade: pontos de lazer. Por isso, acabamos indo para um bairro mais distante para fazer piquenique, exercícios ou passear com o cachorro, por exemplo”, reclama a publicitária.

No Meireles, a situação é parecida em algumas praças. “Frequento diariamente a praça Engenheiro Felipe Borges e a sensação de insegurança é constante. Até presenciei um assalto e cheguei a sofrer uma tentativa. Essa praça é mal cuidada, com muita poeira e equipamentos quebrados. Se trata de uma praça que deveria ser mantida por uma empresa, mas nitidamente isso não acontece. Falta policiamento e manutenção”, denuncia uma das moradoras do bairro e coordenadora de mídia digital, Tamara Nobre.

VISÃO DE ESPECIALISTAS

Para o professor e mestre em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (UFC), Bruno Braga, espaços públicos como praças e parques são fundamentais para qualquer cidade por serem respiros verdes para as grandes áreas construídas de uma metrópole, caracterizando-se como uns dos espaços mais democráticos e abertos a todas e todos.

“A falta ou má qualidade desses espaços repercute no sentido de coletividade e cidadania da população, pois se não há espaço público de qualidade, muitas vezes não há vida pública, encontro, diversidade, tudo aquilo que é fundamental para se ter uma boa qualidade urbana, levando as pessoas a lugares mais privados e, consequentemente, mais isolados dessa vida urbana e que reforçam as desigualdades, pois só poucos têm acesso”, explica.

O professor elucida ainda que para além criar novas praças ou reinventar temas para as praças e parques, “uma melhor qualidade e manutenção destas, com boa acessibilidade, arborização gerando sombras e melhorando o conforto climático e pensando nelas como um conjunto e não só isoladamente, já se poderia melhorar em muito a qualidade urbana de Fortaleza”, salienta.

Para o professor doutor do Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da UFC, Fábio Matos, a cidade interliga pessoas e as praças, por exemplo, se configuram como um espaço máximo para esses encontros. “O que é uma cidade? Ela é essencialmente um lugar de convivência idealizada pelo homem, é justamente o local de encontros. A cidade, segundo Aristóteles, é justamente o princípio máximo do encontro da população. Interliga as pessoas. Praças se configuram como espaços máximo desses encontros em que a sociedade vai convergir, além de se apresentar como um espaço público de encontros e de lazer”. Para o especialista, a preservação desses espaços é uma condição essencial e necessária para própria existência da cidade enquanto cidade.

Na avaliação de Matos, esses espaços em Fortaleza estarem como estão tem a ver também como a estrutura social e geográfica de Fortaleza se formou.

“A cidade de Fortaleza é essencialmente segregada e fragmentada tendo, portanto, acesso desigual aos equipamentos urbanos, incluindo as praças e parques urbanos. Esses locais são apresentados e distribuídos de modo extremamente desigual e isso traz prejuízos sociais. Além de serem maus distribuídos, é interessante abordar que a falta de manutenção dessas praças também se dá de modo desigual. Em áreas nobres, elas permanecem. Enquanto as áreas mais periféricas carecem dessa manutenção”, explica o professor.

Uma saída para a Prefeitura, segundo Fábio, é a manutenção e ampliação de praças e parques urbanos sendo feitas de “modo igual e respeitando a concentração urbana, sobretudo, nas áreas de baixa renda. Estudos recentes já nos mostram que quanto maior as áreas de sociabilização, menos são os riscos da vulnerabilidade urbana”.

Em nota ao Opinião CE, a Prefeitura de Fortaleza informou que abre diálogo com a comunidade para compreender as necessidades daquela região e adequar os projetos à dinâmica do seu entorno. Segundo o texto, o plano de governo do prefeito José Sarto (PDT) prevê a revitalização de 200 praças até o final da gestão. “Um novo pacote de reformas deve ser lançado ainda em 2022, contemplando a reforma de parte desse número”. A Prefeitura não divulgou o orçamento total dessas reformas.

ÚLTIMAS ENTREGAS

Em fevereiro deste ano, a Prefeitura de Fortaleza e o Governo do Ceará entregaram a primeira etapa da requalificação do Parque Rachel de Queiroz, no bairro Presidente Kennedy. Com investimento em urbanização e paisagismo, as obras contemplam a instalação de diversos equipamentos para promoção do lazer e prática de atividade física, e representam mais uma ação do programa Juntos por Fortaleza, parceria entre a Prefeitura e o Governo do Estado.

O projeto, que corresponde aos trechos 1, 2, 5 e 6, foi responsável pela urbanização da região, com a construção de calçadão para caminhadas, ciclofaixa bidirecional, paisagismo, mobiliários urbanos, bicicletários, anfiteatro, pontes de acesso, quiosques, além de diversos equipamentos para o lazer e prática de esportes, como quadras, Areninha, pet place, espiribol, playground e novos espaços para convivência em contato com a natureza.

O novo parque ganhou paisagismo com o plantio de mais de 2.400 espécies de plantas, como arbustos, árvores e palmeiras, além de estação de tratamento conhecida como wetlands, com 9 microlagoas que utilizam um sistema natural de tratamento de efluentes com plantas aquáticas para fitorremediação e decantação, responsáveis pela melhoria da água na região.

Um dos frequentadores do local, o arquiteto Luc Lima, falou sobre o espaço e como avalia as ações da atual gestão. “Costumo ir com minha mulher e filho ao Parque Rachel de Queiroz. A atual gestão tem dado continuidade a algumas ações da gestão anterior quanto à qualificação dos espaços públicos. Espero que consigam promover ainda mais intervenções por toda a cidade com o mesmo esmero e mais participação popular. E que sirva de exemplo para gestores de outras cidades, tanto da região metropolitana quanto do interior do estado. De modo geral as últimas intervenções de qualificação desses espaços têm realmente os melhorando bastante”, pontuou.

Outra recente entrega foi o Parque Ambiental do Passaré, espaço que abriga o Zoológico Municipal Sargento Prata e o Horto Florestal Falconete Fialho. O Parque Passaré recebeu melhorias urbanísticas e de proteção, com o cercamento de toda a área, garantindo a preservação do parque e o acesso de visitantes.

Orçado em cerca de R$ 4 milhões, o parque conta com um calçadão com piso intertravado que contorna o parque, a instalação de gradil de delimitação da área verde, estacionamento com 201 vagas, além de mobiliários urbanos, Areninha e uma trilha interna para circuito de caminhada, onde em um dos trechos é possível caminhar ao lado da Lagoa do Passaré.

No dia do lançamento, o prefeito José Sarto (PDT), afirmou que a Prefeitura está investindo mais de R$ 170 milhões em 30 microparques que serão entregues para a população, após requalificação de áreas degradadas.

O projeto dos microparques usa o conceito de parques naturalizados, isto é, brinquedos, mobiliários e instalações são pensadas a partir de elementos naturais já existentes no espaço. Eles transformam pequenas áreas antes degradadas, em especial próximas a creches, escolas e outros equipamentos públicos, em ambientes verdes com intervenções que atendam as principais demandas apontadas pela população beneficiada.

Segundo a Prefeitura, outros dois parques urbanos estão com reforma em andamento: o Parque da Lagoa da Viúva, no bairro Siqueira, e o Parque do Riacho Maceió, no bairro Varjota. Além disso, por se tratar de uma prioridade da gestão, os demais parques passam por análise técnica para intervenções.

Priscila Baima

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