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20 de abril de 2025

Eu quero uma casa no campo

Obra é de autoria do artista plástico autodidata cearense Demeilson Ferreira. Desenhista e pintor, tem obras em vários estados brasileiros e países como França, Portugal, Canadá e Estados Unidos.

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Quando criança, sonhava em ter uma casa com um quintal na parte da frente e roseiras. Em São Paulo, geralmente, os jardins tinham rosas, muro baixo e grades. Eu passava no caminho do metrô e ficava olhando, tentando decorar para desenhar e colocar na minha redação da volta das aulas, porque, a cada dois anos, passava as férias naquela cidade.

Por lá, nem na casa em que eu morei, nem nas que fiquei hospedada havia jardins, embora existisse espaço. A área da frente sempre era ampla, com chão de caquinhos, colocados pelo meu avô, mas empoeirada e suja. Nada de plantas. Era tudo sem cor e triste.

Em Caucaia, sempre morei em apartamento. No primeiro, em que vivi por 30 anos, minha mãe tinha algumas plantas na escada, assim como a minha vizinha. Depois que minha mãe foi embora, a vizinha cuidava do nosso pequeno jardim. Eu nunca tinha tempo, nem paciência, porque, desde que me formei, trabalhava em dois empregos. Nos fins de semana de folga, eu dormia o máximo que podia. Na semana, saía bem cedo e pouco olhava para as plantas porque geralmente não floriam. Eram folhagens, como espada-de-São-Jorge/comigo-ninguém-pode.

No meu período de sete anos sem trabalhar fora de casa, eu passei a comprar plantas com flores. Nunca sabia o nome das espécies, mas enchi a janela com elas, esperando as borboletas e os beija-flores. Mesmo com roseiras de várias cores, gérberas e cravos, nunca apareceu nada de insetos bonitos na minha janela. Só mesmo as cores e a alegria que eu cultivava devagarinho. Em vez de me preocupar com o futuro, que, para mim, não parecia existir, eu observava as flores e guardava os novos botões dentro dos livros. Me alegrava com a nova roseira amarela, as flores branquinhas do pé de manjericão. E fotografava meus livros entre elas.

A falta de sol do novo apartamento matou todas as roseiras. Tentei cultivar cactos e eles mofaram. Para compensar, o condomínio tinha um jardim lindo. As borboletas, assim como as mariposas e vários insetos diferentes sempre apareciam para me visitar, mesmo eu não tendo plantas e morando no quarto andar.

Recentemente, eu pedi para a minha mãe algumas mudas para tentar um novo jardim na janela. Todas morreram e eu desisti por um tempo.

Vai ficar para quando eu tiver a minha casa dos sonhos no campo, muito provavelmente, na zona rural de Jijoca de Jericoacoara, terra dos meus parentes do lado paterno. Por lá, talvez eu encontre uma nova profissão, possa cultivar flores de outros tipos, fruteiras para atrair os passarinhos.

Poderia ser pequena, com alpendre e varanda, para armar uma rede. Com poucos móveis, muitos livros, uns artesanatos para deixar tudo com o meu jeitinho. Uma mesa que tenha uma vista para a lagoa ou um dos rios que banham aquele lugar privilegiado. De prioridades, apenas um notebook, um caderno e um jeito de escutar música.

Uma casa no campo, onde eu possa criar minhas histórias e para onde eu possa voltar dos meus passeios, um pouso acolhedor e seguro. Olhando para esse horizonte, eu consigo prosseguir nessa rotina caótica de hoje. Ainda não esqueci do versículo bíblico: Quero trazer à memória aquilo que me dá esperança.

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