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21 de abril de 2025

Como o bichinho da leitura continuou o seu trabalho

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Depois de passar a primeira infância em São Paulo, minha família se mudou para o Ceará. Com quase seis anos, era alfabetizada, mas nunca tinha pisado em uma escola. Na calçada de casa, sempre via as meninas passando com seus uniformes e eu, nada…

Quando perguntava, minha mãe justificava dizendo que era difícil encontrar vaga em escola pública e as particulares eram caras demais. Dessa forma, só fui para a escola quando cheguei no Araturi, em Caucaia.

A pequena escolinha só dispunha até a quarta série. Nada de biblioteca, quadra, piscina. Eram salas improvisadas em quartos dos apartamentos do mesmo modelo que eu morava.

Enquanto estudei nessa escola, de onde só saí na sétima série, não tínhamos paradidáticos. A biblioteca que, na verdade, era um depósito dos livros didáticos dos anos anteriores, era o lugar do castigo dos mal comportados.

Tentava ter acesso a novas histórias nos livros de português dos primos, porque era lá que estavam, às vezes, trechos grandes de livros interessantes ou infantis pequenos completos. Foi assim que eu soube da existência de O Menino do Dedo Verde, Menina Bonita de Laço de fita e A Moça Tecelã, obras clássicas voltadas para crianças que se disfarçavam em tarefa de interpretação de texto.

Por volta dos 9 anos, fui cansando das enciclopédias e desses livros. Pedi à minha mãe para ler os livros do Círculo do Livro, que eram sem figuras. Ela me passou um de psicologia que tinha uma criança chamada Dibs. Eu chorei porque o menino era triste e sofria maldades por ser incompreendido. Dizia que se tinha uma criança, eu ia gostar. Aí, ela sem saber o que era direito, deixou eu ler o Mulheres, cheio de mulheres sofridas, com casamentos péssimos, de uma autora feminista chamada Marilyn French. Quando acabei esse, só sobraram uns do Jorge Amado. Na época, não me interessei.

Em uma das viagens que fiz para São Paulo, para visitar uns parentes, herdei os paradidáticos dos primos mais velhos. Coisa pouca, acho que dois. Era Xande, o Grande e Cem Noites Tapuias, da Coleção Vagalume. O primeiro, li e depois fiquei relendo. De tanto uso, estragou. O seguinte, demorei mais para começar e foi o início da curiosidade sobre temas indígenas.

Entediada com esses, passei a aproveitar quando minha mãe saía e me deixava sozinha para explorar os livros proibidos. Eram apenas quatro: o Profecias de Nostradamus, do meu pai, que dava medo porque falava do fim do mundo; a coleção chamada “Amar”, que tratava da sexualidade humana, uns livros pretos que eram desse assunto também, com linguagem cientifica e o de reprodução humana, que, eu sabia, explicava de onde vinham os bebês.

Lembro que, por essa época, minhas colegas de escola também andavam muito curiosas sobre esse assunto e a gente dividia os termos para pesquisarmos. Outra da minha turma também tinha uma enciclopédia assim. É triste recordar que, nessas pesquisas encontramos coisas normais hoje que na época diziam que era doença. E outras que a gente nem entendia nada do que eram mesmo, como priapismo, histeria e outros termos.

Então, chegaram nas bancas as chamadas revistas para adolescentes. Querida, Carícia, Capricho… Eu perturbava minha mãe para comprar e rapidamente tive acesso às informações, enquanto virava adolescente. Esse tipo de conversa era meio atravessado e deixavam para gente aprofundar mais, pelo menos, na minha casa, com revistas e programas de TV.

Depois dos 13, o universo dos livros se amplia porque as amizades leitoras chegam. Falo disso na nossa próxima crônica.

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