O Governo Federal divulgou nesta quinta-feira (5) a mais recente atualização da “lista suja” de empregadores responsabilizados por mão de obra análoga à de escravo. Com 204 novas inclusões, este é o maior número já registrado de entradas de pessoas físicas e jurídicas na base de dados desde a sua criação, em novembro de 2003, conforme informado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
No Ceará, seis empresas parte da lista: Atacadão Redes Paraíba Comércio Eireli, nos bairros Itaperi/Serrinha; BM Chaves Comércio de Combustíveis LTDA, no município de Aquiraz; Demontier de Lima, cerâmica “Como é bom viver”, localizada na zona rural de Russas, no Vale do Jaguaribe; Edson Pinto de Oliveira – Barro Vermelho, em Fortim (Litoral Leste); Francisco Everardo Sampaio – Canteiro de Obras, na Av. Visconde do Rio Branco, no bairro Joaquim Távora, em Fortaleza; e Polo Construções LTDA, em Itaitinga (Grande Fortaleza).
No Estado, 33 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão.
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BRASIL
Dos 204 novos empregadores de todo o País incluídos na lista, a maioria é do setor da produção de carvão vegetal (23), seguido por criação bovina (22), serviços domésticos (19), cultivo de café (12) e extração e britamento de pedras (11). Entre as unidades da federação, a maior quantidade de novos casos foi registrada em Minas Gerais (37), seguida por São Paulo (32), Pará (17), Bahia (14), Piauí (14) e Maranhão (13).
A Lista Suja mostra que os 473 empregadores submeteram, ao todo, 3.773 trabalhadores a condições análogas à escravidão. Já o total de pessoas resgatadas nessas condições pela Inspeção do Trabalho no Brasil, desde 1995, chega a mais de 61 mil pessoas, segundo MTE. Essa diferença se explica pelo fato de que, para entrar nesta lista, é necessário esgotar os recursos administrativos contra o auto de infração aplicado pelos fiscais que encontram pessoas em condições semelhantes à escravidão.
HEINEKEN
Entre as empresas que aparecem na lista, consta o da Cervejaria Kaiser, empresa do grupo Heineken. Segundo as investigações, 23 motoristas da Transportadora Sider, prestadora de serviço, estavam trabalhando em condições análogas às de escravo. Todos eles eram migrantes estrangeiros – um haitiano, e os demais, venezuelanos. A jornada de trabalho foi considerada exaustiva, sem tempo para descanso semanal remunerado nem intervalo de jornada. Também foram identificadas condições degradantes, pois parte dos trabalhadores não tinha residência e dormia no próprio caminhão.
Em nota, o grupo Heineken afirmou que, na época da fiscalização, a empresa se mobilizou para “dar todo apoio aos trabalhadores envolvidos e para garantir que todos os seus direitos fundamentais fossem reestabelecidos prontamente”. O texto informa ainda que a transportadora não faz mais parte do quadro de fornecedores da companhia. A nota informa que a Heineken reafirma o “respeito à legislação e aos direitos dos trabalhadores”, e segue “à disposição para continuar construindo, em parceria com o mercado, formas de trabalho e controle para que casos como esse não se repitam no futuro”.
FISCALIZAÇÃO
A vice-presidente da Associação Nacional dos Procuradores de Trabalho (ANPT), Lydiane Machado e Silva, afirmou que o aumento da pobreza nos últimos anos, em especial devido à pandemia de covid-19, e o apoio do novo Governo à fiscalização contra o trabalho escravo explicam o recorde no número de novos empregadores.
“A pandemia agravou a vulnerabilidade econômica das pessoas. Então, essas pessoas são presas mais fáceis para os cooptadores de trabalhadores. Fica mais fácil aceitar promessas de emprego que, no final das contas, são empregos que não estão observando os requisitos mínimos da legislação brasileira”, disse.
A procuradora Lydiane contou que as condições precárias de trabalho costumam se repetir nesses casos marcadas por alojamentos precários, sem banheiros e com alimentação sem armazenamento adequado. Outra situação que tem aumentado é a de resgate de mulheres submetidas a essas condições no trabalho doméstico. “Em que pese sempre haver uma desculpa de que ela é tratada como uma pessoa da família, o que a gente percebe, na realidade, é que ela é colocada em um quartinho dos fundos, muitas vezes em condições insalubres, sem acesso à convivência social com outras pessoas”, relatou.
LISTA
Lançada há 20 anos, no primeiro governo do presidente Lula (PT), a “lista suja” é atualizada semestralmente, com a entrada e saída de nomes, e permaneceu em vigor durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ela é reconhecida pelas Nações Unidas como um dos principais exemplos globais de combate à escravidão contemporânea. A ferramenta não impõe bloqueios comerciais ou financeiros, mas tem sido usada por empresas brasileiras e estrangeiras para seu gerenciamento de riscos, tornando-se um exemplo global no combate ao trabalho escravo. Em setembro de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou sua constitucionalidade. O combate ao trabalho análogo ao de escravo é uma preocupação legal desde a década de 1940, e o Código Penal Brasileiro prevê a punição para esse crime.
DENÚNCIAS
Denúncias de trabalho escravo podem ser feitas sigilosamente no Sistema Ipê, lançado em 2020 pela Secretaria de Inspeção do Trabalho em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Os dados oficiais sobre o combate ao trabalho escravo estão disponíveis no Radar do Trabalho Escravo da SIT. O trabalhador também pode entrar em contato por meio dos canais de denúncias de violações de direitos humanos: Disque 100, ligue 180, aplicativo Direitos Humanos Brasil e o site da Ouvidoria/ONDH.