De acordo com o Relatório Anual do Desmatamento (RAD) no Brasil 2022, o Ceará teve aumento de 13% da área desmatada entre 2021 e 2022. O dado foi apresentado na última quinta-feira, 17, em um seminário realizado pela rede colaborativa MapBiomas, formada por ONGs, universidades e startups de tecnologia. Dos municípios cearenses, Crateús foi o que registrou maior desmate, com uma área afetada de quase 1.000 hectares.
Em entrevista ao OPINIÃO CE, a bióloga e doutora em Ciências Marinhas Tropicais, Liana Queiroz, afirma que a situação do Ceará é bastante preocupante. “O Estado foi o grande campeão tanto em área quanto em número de alertas e isso é preocupante. O aumento significa, em média, 63 campos de futebol de desmatamento por dia”, pontua.
Entre os fatores que contribuíram para esse aumento, segundo a bióloga, está o fato de que muitos dos desmatamentos são ilegais, acrescentado ao número de desmates legais. De acordo com dados do MapBiomas, o Ceará enfrenta dificuldades quanto à fiscalização de desmatamentos.
“Esse desmatamento ilegal não é fiscalizado, não é punido e isso favorece ainda mais o avanço do desmate ilegal. Além disso, segundo o relatório, o Ceará tem um crescente número de autorização de supressão avaliada, sem contar as supressões autorizadas por municípios, que são grandes apesar de não terem dados disponibilizados. Contando somente com as autorizações estaduais e federais já têm um número muito crescente”, destaca Liana.
A bióloga ressalta ainda que, atualmente, apenas 0,6% do território do Estado está protegido por uma Unidade de Conservação (UC) de Proteção Integral. O dado evidencia a necessidade do avanço de demarcações em número e em tamanho de área de UCs, tanto de Proteção Integral como de Uso Sustentável, segundo Liana. “O que temos hoje é uma porção muito pequena do território, deixando a Caatinga completamente vulnerável ao crescimento do desmatamento”.
Conforme explicou Carolina Braga, diretora de Fiscalização (Difis) da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), à reportagem, alguns fatores concorrem para essa situação atual do Ceará como, por exemplo, a deficiência técnica para manejo florestal nas populações, principalmente no interior do Estado; a pouca compreensão dos impactos decorrentes do desmatamento pelas populações e a necessidade de fortalecimento da educação ambiental e da fiscalização; além da dificuldade de encontrar a autoria dos ilícitos para responsabilização.
“Precisamos saber quem são os donos dos imóveis onde ocorreu o desmatamento, bem como quem realizou a irregularidade. Aplicando as medidas administrativas devidas é possível dissuadir novas infrações”, alegou.
MEDIDAS
Presente no seminário do MapBiomas, Ana Leônia, fiscal ambiental da Difis, assegurou que o órgão tem acompanhado de perto os alertas e aplicado as medidas administrativas cabíveis em face das irregularidades. No total, foram registrados 3 mil alertas em 2022. Ao OPINIÃO CE, a diretora da Difis, Carolina Braga, esclareceu que, diante dos resultados, a Semace vem fortalecendo o trabalho de investigação da fiscalização ambiental e implementou o procedimento de fiscalização remota. O formato funciona por meio do cruzamento de bases de dados de informações de pessoas físicas e jurídicas, com imagens de satélite diárias.
“Estamos investindo em tecnologia e inteligência. No entanto, precisamos fortalecer também a fiscalização a ser realizada pelos entes municipais, prevista na constituição federal. Nessa trilha, buscamos auxiliar os municípios com apoio técnico e troca de conhecimentos e experiências, disponíveis para atuar em colaboração”, certificou a diretora.
Para Liana Queiroz, o Poder Público desempenha um papel imprescindível nas políticas públicas de proteção das florestas cearenses. Segundo a bióloga, é necessário o avanço da demarcação de terras indígenas e territórios quilombolas, que é uma das estratégias de proteção mais eficaz para as matas, conforme o MapBiomas.
“É necessário a ampliação das unidades de conservação, demarcação, fiscalização, equipar bastante nossas brigadas florestais para evitar que incêndios devastam nossas florestas, e entender a proteção da biodiversidade para que o avanço das renováveis não seja um vetor de desmate no nosso Estado”, acrescenta, ao relacionar o aumento de desmatamento, também, ao avanço das energias fotovoltaicas – energia renovável que utiliza a radiação solar para gerar eletricidade. “Se todos os projetos de energia fotovoltaica forem à frente, na fase de instalação, teremos uma devastação massiva da nossa Caatinga”, completou.