Na reta final da campanha, o ex-presidente Lula (PT) demonstra preocupação em cima de fundamentos de avaliações de sua equipe de que o perfil dos eleitores do candidato tem a maior probabilidade de se abster da votação.
O cientista político e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Rodrigo Prando explica que estudos apontam a abstenção maior no eleitorado de baixa renda e de menor escolaridade, “justamente nesse segmento do eleitorado que o ex-presidente Lula tem uma vantagem considerável ao presidente Jair Bolsonaro [PL].”
“O não comparecimento e a abstenção acabaria de uma certa maneira prejudicando muito mais Lula que Bolsonaro. E é por isso que o PT faz dois movimentos. Um é esse de que as pessoas compareçam ao local de votação e votem, e o outro pelo voto útil.”
A pesquisadora Paula Vieira, doutora em Sociologia e professora da Unichristus, aponta ainda que a busca pelo engajamento popular nas votações é também uma estratégia antiga do PT, que busca incentivar a participação cidadã.
“Essas pessoas que estão se abstendo propositalmente estão querendo sair da discussão política, do que entendem por polarização, por conflito, por algo que é desconfortável. O PT tanto tem a questão de estratégia como também a de formação política cidadã, de que as pessoas participem dessas questões e estejam interessadas no processo eleitoral”, acrescenta.
Nas Eleições 2018, quase 30 milhões (20,3%) de eleitores deixaram de comparecer às urnas no Brasil. O número foi o mais alto registrado desde 1998, quando 21,5% do eleitorado não votou. A abstenção tem avançado desde as eleições de 2006, quando 16,8% dos eleitores faltaram ao processo.
Em 2010, o índice subiu para 18,1% e, em 2014, para 19,4%. Há quatro anos, o Ceará foi o terceiro estado do Nordeste com maior abstenção, com 17,3% de não votantes. Nas eleições municipais de 2020, no segundo turno, 29,5% dos eleitores brasileiros não foram registrar sua preferência por representantes políticos.
Contudo, como era ano de pandemia, o ministro Luís Roberto Barroso, na época presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), avaliou esse aspecto como responsável por fazer crescer a abstenção.
POR QUE VOTAR?
Paula Vieira defende que as eleições são “o único espaço que nós temos para manifestar algum poder de decisão.” “É o espaço mais imediato de algo que nós podemos escolher. E nós escolhemos os representantes, aqueles que vão decidir questões que são coletivas”, avalia.
“Costumo dizer aos meus alunos que não escolhemos o pai e a mãe, o chefe, o padre, o sacerdote, não escolhemos a professora, mas escolhemos os políticos”, reforça Prando. Para o cientista político “a vida em sociedade implica a escolha dos representantes.”
Por isso, diz, é importante comparecer às urnas não só nessas eleições, mas em todas. Contudo, neste pleito, o docente avalia que há um “teste das nossas instituições e do limite da democracia.” Isto decorre dos constantes ataques que o presidente Jair Bolsonaro fez, durante todo o mandato, ao processo eleitoral.
Na última segunda-feira, 26, Bolsonaro voltou a questionar a lisura do processo eleitoral. O candidato à reeleição disse que vai esperar o resultado das urnas, antes de decidir se irá ou não reconhecê-lo, e falou sobre a desconfiança das pesquisas de intenção de voto que colocam Lula na liderança.
“E o que é a democracia? É a vontade popular. A gente não está vendo a vontade popular expressa nos institutos de pesquisa, em especial o Datafolha e muito menos dentro do TSE”, afirmou Bolsonaro em sabatina ao Jornal da Record.
Segundo Prando, “muita gente provavelmente vai votar nessas eleições com medo, com receio das ações da retórica de Bolsonaro.” “Uma retórica que em inúmeros momentos trouxe uma noção de ruptura institucional. O presidente conseguiu plantar uma dúvida em muitos brasileiros que, provavelmente, votarão com medo das consequências, por exemplo, de um segundo mandato ou de um segundo turno com Bolsonaro”, completa.