Voltar ao topo

7 de dezembro de 2024

“As pessoas podem se inspirar a escrever, ou reescrever, suas próprias histórias”

Psiquiatra Nayana Holanda destaca importância do chamado Janeiro Branco, em que a sociedade brasileira é convidada a debater o tema da saúde mental
Foto: Arquivo Pessoal

Compartilhar:

Durante o chamado Janeiro Branco, as unidades de saúde de todo o País, assim como ONGs e sociedade civil, são convidados a debater o tema da saúde mental no Brasil. Principalmente após a pandemia de covid-19, as sequelas psíquicas ficaram mais latentes. Em 2022, por exemplo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou a sua maior revisão mundial sobre saúde mental desde a virada do século. Em 2019, primeiro ano da crise sanitária, segundo a OMS, quase um bilhão de pessoas, incluindo 14% dos adolescentes do mundo, viviam com algum transtorno.

Neste contexto, o suicídio foi responsável por mais de uma em cada 100 mortes no mundo em 2020 – 58% dos suicídios ocorreram antes dos 50 anos de idade. Segundo dados do Ministério da Saúde, o Brasil ficou, em 2022, entre os 10 países onde o suicídio mais acontece – são mais de 12 mil por ano. A Capital cearense, Fortaleza, excluindo São Paulo (que tem uma população quatro vezes maior), aparece como a cidade brasileira com maior número. São cerca de 300 por ano. Além disso, os números são subdimensionados por causa do preconceito.

O OPINIÃO CE conversou com a psiquiatra Nayana Holanda, que atua no Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto, em Fortaleza. Além de abordar os principais tipos de transtornos atendidos na unidade, a especialista destaca o Janeiro Branco como uma oportunidade de promover o autocuidado e ter uma melhor qualidade de vida.

OPINIÃO CE: O que é o Janeiro Branco e qual a importância dele na promoção do debate sobre a saúde mental?
NAYANA HOLANDA: No primeiro mês do ano, em termos simbólicos e culturais, as pessoas estão mais propensas a pensar em suas vidas, suas relações sociais, suas emoções, seus propósitos. Como em uma ‘folha em branco’, as pessoas podem se inspirar a escrever, ou reescrever, suas próprias histórias de vida. Essa é uma campanha dedicada a colocar os temas da saúde mental em evidência para toda a sociedade. Idealizada pelo psicólogo mineiro Leonardo Abrahão, a campanha ganhou vida em janeiro de 2014. Desde então, vem utilizando o primeiro mês de cada ano como uma plataforma simbólica para convidar as pessoas a pensarem sobre suas vidas, suas condições sociais e psicológicas, seus relacionamentos pessoais e profissionais, assim como o sentido que atribuem às suas vidas e os propósitos aos quais se dedicam. Tem a importância de chamar a atenção das mídias, instituições, cidadãos e autoridades públicas para a relevância das políticas públicas e privadas em defesa da saúde mental.

OPINIÃO CE: Quais os tipos de transtornos mais comuns atendidos no Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto?
NAYANA HOLANDA: Transtornos de ansiedade, transtornos depressivos, transtorno bipolar, TOC [Transtorno obsessivo-compulsivo], transtornos de personalidade, esquizofrenia etc.

OPINIÃO CE: Geralmente, o que causam esses transtornos e quais os principais tratamentos?
NAYANA HOLANDA: As causas são multifatoriais. Elas podem estar relacionadas à herança genética, estilo de vida, eventos estressores, eventos traumáticos, contexto social etc. Os tratamentos envolvem principalmente três elementos: 1) medidas de mudanças de estilo de vida, como dieta balanceada, prática de atividade física, rotina adequada de sono; 2) psicoterapia e, em parte dos casos; 3) intervenções farmacológicas, com medicações. Cada um deles deve ser individualizado para cada paciente.

OPINIÃO CE: Quais seriam dicas concretas de como as pessoas podem cuidar da saúde mental e minimizar os gatilhos?
NAYANA HOLANDA: É importante praticar atividade física regularmente, idealmente pelo menos quatro vezes por semana; manter uma dieta balanceada; manter uma boa higiene do sono, ou seja, dormir em ambiente silencioso, escuro, sem telas; não usar alimentos ou bebidas estimulantes à noite; não deitar com o estômago muito cheio nem muito vazio; não ficar acordado de noite e dormir de dia. Outras recomendações são tentar manter uma rotina regular, com horários regulares para sono, refeições, trabalho, estudos, lazer e descanso. É importante preservar o tempo para atividades de lazer e descanso, assim como evitar, na medida do possível, situações estressoras cronicamente. Evitar bebida alcoólica, cigarro ou outras substâncias psicoativas e não praticar automedicação também são fundamentais. Praticar meditação. A sugestão é a ‘técnica de meditação’ mindfulness [Prática de se concentrar completamente no presente. O objetivo é manter a atenção plena, que não busca esvaziar a mente de pensamentos, mas prestar atenção nas ações do presente, sem apego ao passado ou sem se preocupar em excesso com o futuro.

OPINIÃO CE: Além do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto, onde é possível buscar ajuda médica em Fortaleza e no Ceará?
NAYANA HOLANDA: É possível buscar esses atendimentos nos CAPS [Centro de Atenção Psicossocial]. Cada regional tem suas unidades. Algumas policlínicas também oferecem esses serviços. Postos de saúde podem e devem fazer também os atendimentos em nível primário relacionados aos transtornos de saúde mental.

REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (RAPS)
Oferecido pelo serviço público, a Raps visa melhorar o cuidado de pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do SUS.

Unidade Básica de Saúde: A equipe de Saúde da Família cuida de pessoas com transtornos mentais comuns (ansiedade; falta de sono; depressões leves e moderadas; problemas com álcool, cigarro e outros).

Centro de Atenção Psicossocial (Caps): São atendidas pessoas com transtornos mentais graves (depressões graves; transtornos psicóticos; problemas graves por uso problemático de drogas, entre outros).

Rede de Urgência e Emergência (UPAs, Samu, hospitais): Atendimento a casos de crise que não foram resolvidas nos postos de saúde ou Caps. Ambulatório com equipe especializada em saúde mental Cuidam de pessoas que apresentam transtornos mentais moderados e dão suporte aos Caps.

*Quem reside no Ceará e precisar de ajuda pode buscar serviços nos CAPS, nos núcleos de psicologia de universidades ou no Centro de Valorização da Vida (CVV), que atende pelo número 188. Todos os serviços são gratuitos.

[ Mais notícias ]