Eis que chego com a família em Aracati no domingo do tão aguardado feriado de Carnaval. Depois de dar uma olhada na cidade, fomos para querida Canoa que continua com seu charme, sua energia, mas muito diferente dos idos nos anos 70. Devo admitir: Aracati sem o Carnaval é estranha. Bateu aquela saudade, daquele carnaval de meados dos anos 1980 e 1990. Tive a sensação de ouvir as músicas carnavalescas e de vivenciar e sentir aquele riso carnavalesco que é geral, que é universal, independentemente da hierarquia social.
O entrudo, o mela-mela, os sobrados que parecem guardar na memória toda aquela violação do carnaval e sua libertação temporária das hierarquias sociais, dos privilégios, dos tabus sexuais e do que era tido como verdade dominante. Mas também aquela tristeza, nostalgia e saudade dos amigos e amigas que não se encontram mais por aqui. Pois é. O entrudo – sua manifestação popular, de transgressão – não-oficial se realizava nesses dias, quando os brincantes lançavam uns nos outros farinha baldes de água, limões de cheiro etc.
Pela sua transgressão, no Brasil entrou em declínio volta de 1854, por repressão policial. Mas o Carnaval e seu caráter cômico popular é indestrutível: ele se recria, se reinventa. No Aracati, o entrudo, o nosso conhecido mela-mela era muito divertido. Sobre o Carnaval e a cultura popular na Idade Média e no Renascimento, Mikhail Bakhtin relata: “O Carnaval era onde se ofereciam novas formas de relações entre os homens.
O local era o centro da cidade onde o povo cantava, dançava nas ruas, usando máscaras, quando os homens se vestiam de mulher e as mulheres de homens. Cardeais, monges, magistrados representavam novos papéis dentro da multidão. O Carnaval era uma festa coletiva onde todos se divertiam sem a necessidade de palco. O palco era o povo, senhor da festa”. Então, viva o Carnaval e sua índole democrática.